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quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Eleições 2018: novas candidaturas, velhos desafios, por Carmela Zigoni.

on 21/08/2018Categorias: Brasil, Comportamento, Destaques, Economia, Políticas, Sociedade

Lançamento de 59 pré-candidaturas, de 90 estados, no Ocupa Política do Teatro Oficina
Cresce diversidade, mas machismo, racismo e recursos desequilibram o pleito. Homens são mais que dobro de candidaturas femininas, mas maioria das mulheres é jovem – o que dá esperança no futuro
Por Carmela Zigoni
O perfil das candidatas e candidatos às Eleições 2018 apresenta alguma mudança em relação ao último pleito em 2014, mas os desafios às candidaturas de mulheres, negros, negras e indígenas continuam.
Mulheres ainda são minoria 
Do total de 27.835 candidaturas para todos os cargos, 69% são de homens e apenas 31% de mulheres. Os partidos com maior quantidade de mulheres são o PMB (39,42%) e o PSTU (38,39%), e os que contam com menor número de mulheres são o PSL (28,29%), PPL (28,31%) e o DEM (28,38%).
No segmento juventude, a proporção de mulheres é maior: elas são 51% na faixa de 20 a 24 anos (242 candidatas) e 44% na faixa de 25 a 29 anos (435 candidatas). Os homens são maioria nas faixas de 65 a 69 anos, com 74% (913 candidatos) e 72% na faixa de 60 a 64 anos (1.671 candidatos).
Se considerarmos os candidatos entre 30 e 59 anos (21964 candidaturas), a média é a estipulada pelas cotas previstas na Lei 9.504/97: proporção de 70% homens para 30% mulheres, lembrando que a faixa de 40 a 54 anos concentra o maior número de candidaturas (13.021).
Com relação à proporção de mulheres por cargo concorrido, observa-se sua baixa presença, muito menos do que o mínimo de 30%, em cargos como governador (14,57%), presidente (15,38%) e senador (17,24%). Já para o Legislativo, a média se mantém nos 30% definidos pela Lei.

Mulheres negras e indígenas
Em relação aos números de 2014, cresceu em 70% o número de candidatas que se autodeclaram pretas: de 679 para 1.153. O aumento de candidatas pardas foi um pouco menor (23%): de 2.328 para 2.862, acompanhando o crescimento geral das candidaturas. Porém, ao olharmos para o universo das candidaturas, que também cresceu, em 22% (de 22.907 em 2014 para 27.835 em 2018), a proporção de mulheres negras se manteve relativamente estável: de 13% em 2014 para 14% em 2018. Considerando que as mulheres negras (pretas + pardas) representam 25% da população brasileira, o número de candidatas continua aquém da representatividade.
Das 13 candidaturas para a presidência da república, apenas duas candidatas registradas se declaram negras: Marina Silva, da Rede Sustentabilidade, e Vera Lucia, do PSTU; além da candidatura indígena de Sonia Guajajara à vice-presidência pelo PSOL.
Considerando a autodeclaração a partir das categorias do IBGE quanto à raça/cor, do total de candidatas, 16% são brancas (4.417candidatas), 4% pretas (1.153), 10% pardas (2.862) e somente 0,24% amarelas (66) e 0,17% indígenas (47). Verificou-se leve aumento nas candidaturas de mulheres brancas, de 14% para 15% (em 2014 foram 3.512 candidatas). Houve pequena queda nas candidaturas de homens brancos, de 40% em 2014 para 37% em 2018.
Presença de negros e indígenas
Os candidatos autodeclarados indígenas aumentaram em 59% em relação ao pleito anterior, passando de 81 para 129 candidatos.
Se considerarmos negros a somatória de pretos e pardos, o total de candidaturas é de 46% – 14% de mulheres negras e 32% homens negros (destes, 7% se declararam pretos e 25% pardos) – um discreto crescimento em relação a 2014, quando as pessoas negras representaram 44% do total.

Os negros (pretos + pardos) representam mais de 51% das candidaturas nos partidos PATRI (51,72%), PCdoB (55,74%), PHS (53,12%), PMB (54,12%), PMN (51,67%), PRP (52,89%), PPL (53,18%), PSC (54,33%), PSOL (54,29%), PSTU (53,55%), PTC (54,79%), SOLIDARIEDADE (51,37%) e REDE (54,26%). O partido com menos representantes negros é o NOVO (14,49%). O MDB conta com 36,32% de pretos e pardos, o PSDB com 32,72% e o PT com 49,32%.
No que se refere aos cargos, candidatos pretos, pardos e indígenas estão mais concentrados nas candidaturas para deputado estadual e federal, e os brancos são maioria para o Senado, governos e Presidência.

Com relação aos estados, somente Goiás não tem candidatos que se autodeclaram indígenas. O maior número de candidaturas neste grupo se encontra em Roraima (20), Amazonas (17) e Ceará (10). Os que se autodeclaram pretos estão mais presentes no Rio de Janeiro (558), São Paulo (400), Minas Gerais (258) e Bahia (251). Considerando pretos e pardos, os estados com maior número de candidaturas de negros e negras é o Rio de Janeiro, com 1.685 candidaturas, seguido de São Paulo, com 1.008.


Diversidade nas candidaturas
Além do aumento em números absolutos de mulheres negras e indígenas no pleito, outra mudança positiva foi o reconhecimento, pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE),  do nome social de pessoas trans. De acordo com a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), https://antrabrasil.org/candidaturas2018/ são 43 candidaturas de pessoas trans para os cargos de deputado estadual e federal, em 18 estados do Brasil.
Com relação às candidaturas quilombolas, ainda que as categorias do IBGE não contemplem este grupo populacional, a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ) informou que serão 6 candidaturas quilombolas, sendo 5 de mulheres: Piauí, Goiás e Sergipe (deputado estadual); Maranhão e Rio de Janeiro (para deputado federal), pelos partidos PT (2), PSOL (2) e PSB (1).
A necessária reforma do sistema político
Assim, ainda que possamos identificar candidaturas mais plurais do ponto de vista da diversidade étnico-racial e de gênero, novos(as) candidatos(as) enfrentarão um sistema eleitoral que continua jogando contra a democratização dos espaços de poder. Em 2014, por exemplo, das 30% candidatas mulheres, somente 10% foram eleitas para o Parlamento. Destas, menos de 4% eram negras (pretas e pardas). Elas enfrentam o machismo e o racismo nas campanhas, e também são as candidatas com menos recursos para divulgar suas propostas aos eleitores.
Em relação ao recorte de raça/cor, embora o balanço racial das candidaturas se aproxime um pouco mais do perfil da população brasileira, no voto a situação muda, pois o racismo e o machismo operam também na hora da escolha pelos eleitores e se concretiza em espaços de poder ocupados majoritariamente por brancos.
Como vimos, nem todos os partidos cumpriram a cota de 30% de mulheres no pleito. As candidatas são, em geral, mais jovens e disputam os cargos de deputada estadual e federal, havendo muito menos mulheres candidatas para ocupar o Senado, os governos estaduais e a Presidência. O mesmo ocorre ao considerarmos o perfil étnico-racial. Uma estratégia adotada pelos partidos para dialogar com as eleitoras parece ter sido garantir mulheres no lugar de vice ou suplente.
Vitória dos movimentos sociais, o fim do financiamento empresarial de campanhas é uma realidade, mas não veio acompanhada de mecanismos de financiamento público que equilibrem o jogo: candidatos com patrimônio e renda altos acabarão se beneficiando do novo modelo. Isso porque o fundo público criado usa os mesmos critérios de partilha que o fundo partidário e tempo de TV, favorecendo os grandes partidos. Outro desafio para a maioria das candidaturas, especialmente as novas, é dialogar com o eleitor que não vota em ninguém: a soma de abstenções, brancos e nulos representou cerca de 29% do eleitorado em 2014 e 32,5% em 2016. Iniciativas inovadoras têm surgido para enfrentar este cenário, como a plataforma Mulheres Negras Decidem e as candidaturas coletivas.
Em 2014, demonstramos como o Congresso Nacional eleito se assemelhava em muito às casas grandes  do período colonial brasileiro: branco, masculino, proprietário; além de machista e comprometido com bancadas econômicas e religiosas. Assistimos à forma como, desde então, estes parlamentares têm atuado, compactuando com a violação de direitos de mulheres, juventude negra, LGBTI, indígenas e quilombolas, e também contra os trabalhadores e grupos mais pobres da sociedade. Neste sentido, podemos afirmar que sem uma reforma ampla e participativa do sistema político, pouco ou nada avançaremos em termos de representatividade, diversidade e superação das desigualdades no processo eleitoral brasileiro.
*Tratamento da base de dados realizado por: Nailah Veleci, Consultoria em Estatística

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