20/11/2017 19:32
O percurso de identificação e compreensão dos desafios relacionados à promoção e proteção dos direitos humanos da população idosa no Brasil revela uma contradição, um descompasso entre as políticas públicas e as desigualdades geradas por determinantes sociais (aspectos políticos e econômicos específicos), que levam grande parte da população idosa a situações de vulnerabilidades.
Estudiosos do tema apontam uma possível tentativa de solução para esse descompasso sugerindo a integração da gestão da política da pessoa idosa com os três níveis de governo, por meio de um diálogo permanente entre as políticas públicas. Indicam ainda que os determinantes sociais devam ser considerados na escolha das intervenções e no cumprimento destas políticas.
Portanto, assumir o envelhecimento digno como um direito fundamental e como uma prioridade política representa, hoje, o maior desafio para os sistemas governamentais brasileiros.
A Cooperação Intergeracional estabelece uma estratégia clara e viável de ampliação das políticas de proteção social da pessoa idosa mediante a participação das administrações públicas e por meio da efetivação de mecanismos de cooperação entre os serviços sociais, o estado e população.
O envelhecimento ativo e a cooperação intergeracional constituem o alicerce de sustentação de políticas que respondem ao envelhecimento demográfico, enfatizando a construção de uma sociedade para todas as idades.
O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais preconiza que a universalização desses direitos e sua efetivação estão condicionadas à atuação do Estado, sendo ainda uma obrigação jurídica que se fundamenta nos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos.
Em consonância com as normatizações internacionais, o Sistema Brasileiro de Garantia dos Direitos da Pessoa Idosa está amparado por diversos documentos legais e planos de ação política que garantem seus direitos, inclusive à não discriminação.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos demarca, sob a ótica normativa internacional, a superação da concepção de que os direitos sociais, econômicos e culturais não são direitos legais. Exemplo disso é a Constituição Federal que, no art. 3°, inciso IV explicita que se deve promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Em seguida, o caput do art. 5° é bastante específico: “Todos são iguais perante a lei, sem discriminação de qualquer natureza”.
Especificamente em relação à discriminação à pessoa idosa o Estatuto do Idoso, em seu Art. 4º, dispõe que “nenhum idoso será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação, violência, crueldade ou opressão, e todo atentado aos seus direitos, por ação ou omissão, será punido na forma da lei”.
A Cooperação Intergeracional, como dissemos, constitui um alicerce de sustentação das políticas, mas também de aprendizagens. Cabe, então, considerar que em toda modalidade de relação há que se ter presente o atuar sem que haja dano.
Um propósito fundamental para que se tenha uma sociedade para todas as idades é promover o diálogo e as relações intergeracionais. Documentos do Plano de Ação internacional de Madri sobre o Envelhecimento (Nações Unidas, 2002) e da Agenda sobre Envelhecimento Colômbia século XXI (2002) podem inspirar sugestões e possibilidades facilitadoras de relações intergeracionais, tais como:
.- Propiciar a educação entre a infância e a juventude e a Adultez, enfatizando a educação permanente, compartilhada ao longo da vida;
.- Estabelecer serviços de saúde que provam cuidado recíproco;
.- Considerar alternativas de trabalho em condições de dignidade e respeito mútuo;
.- Buscar modelos de habitações que promovam a coexistência intergeracional, quando isso seja apropriado do ponto de vista cultural e os indivíduos desejem; estabelecer uma perspectiva ampla e inclusiva da cultura, que leve em conta interesses, gostos e preferência distintos e que, ao mesmo tempo, possibilitem compartilhar intergeracionalmente em diferentes entornos culturais;
.- Construir e adequar espaços inclusivos segundo os interesses e possibilidades que prefiram, e que facilitem o compartilhar entre gerações. Aqui, chamo especial atenção para as “Academias da Terceira Idade” - termo com o qual não concordo, pois que não há primeira nem segunda idade; portanto, não há terceira nem quarta - adquiridas com recursos de Emendas Parlamentares, “compra de votos”, e quase nunca instaladas próximo aos equipamentos de recreação de crianças. Como explicar isto?
Nada do já mencionado se fará realidade caso não se constitua formas de co-educação. Cabe aqui mencionar uma frase, célebre, do pioneiro em educação popular, Paulo Freire (192-1997), que sintetiza o que significa co-educação: “Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, midiatizados pelo mundo. Tal afirmação, junto à educação e aprendizagem permanente, são elementos fundamentais para a co-educação intergeracional, indispensável em um mundo que muda rapidamente.
A partir da segunda metade do século xx se tem falado e comprovado com maior frequência, sobre o distanciamento entre gerações. Entre as possíveis influências estão as políticas que favorecem o distanciamento entre as gerações. A isso podem contribuir, por exemplo, políticas setoriais, instituições sociais, instituições pensadas para idades específicas, Instituições de Longa Permanência para Pessoas Idosas, educação exclusiva ou preferencialmente orientada para a população jovem; oportunidade de palestras, cursos ou trabalho restringidos por idade.
As influências familiares e transacionais, na perspectiva das relações entre avós/os e netos/as, diante das diferenças ou semelhanças de interesses, dependendo das situações e características diversas, podem, em muitas ocasiões, resultar em violências. Isso tem variado de acordo com os tempos, culturas e contextos.
Há desafios imensos, o que faz necessário realizar um exercício investigativo sobre metabolismo geracional, ou mudanças geracionais sobre as trajetórias.
A velhice das próximas gerações será muito diferente da velhice que estão vivendo as atuais gerações. Há que se pensar e estabelecer objetivos nacionais, estratégias e prioridades claras e viáveis de ampliação das políticas de proteção social da população idosa.
Enfatiza-se que as ações voltadas para a pessoa idosa devem ser realizadas com a participação das administrações públicas e através da efetivação de mecanismos de cooperação entre os serviços sociais, o estado e população.
* Pós-Graduada em Psicopedagogia Institucional. Bacharel em Ciências Sociais. Licenciatura Plena em Ciências Sociais. Membro do Grupo de Especialistas da OEA, responsável pela elaboração da Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos das Pessoas Idosas, de 2012 a 2015. Foi coordenadora da área de Direitos da Pessoa Idosa do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos. Presidiu a Comissão Interministerial do Compromisso Nacional para o Envelhecimento Ativo. Presidiu o Comitê ibero-americano sobre a situação das pessoas idosas na região. Organizou e coordenou a publicação de quatro livros: Dez anos do Conselho Nacional dos Direitos do Idoso - repertórios e implicações de um processo democrático. Estatuto do idoso - Dignidade humana como foco. Manual de enfrentamento à violência contra a Pessoa Idosa - Mapa das políticas, programas e projetos do governo federal para a população idosa.
Estudiosos do tema apontam uma possível tentativa de solução para esse descompasso sugerindo a integração da gestão da política da pessoa idosa com os três níveis de governo, por meio de um diálogo permanente entre as políticas públicas. Indicam ainda que os determinantes sociais devam ser considerados na escolha das intervenções e no cumprimento destas políticas.
Portanto, assumir o envelhecimento digno como um direito fundamental e como uma prioridade política representa, hoje, o maior desafio para os sistemas governamentais brasileiros.
A Cooperação Intergeracional estabelece uma estratégia clara e viável de ampliação das políticas de proteção social da pessoa idosa mediante a participação das administrações públicas e por meio da efetivação de mecanismos de cooperação entre os serviços sociais, o estado e população.
O envelhecimento ativo e a cooperação intergeracional constituem o alicerce de sustentação de políticas que respondem ao envelhecimento demográfico, enfatizando a construção de uma sociedade para todas as idades.
O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais preconiza que a universalização desses direitos e sua efetivação estão condicionadas à atuação do Estado, sendo ainda uma obrigação jurídica que se fundamenta nos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos.
Em consonância com as normatizações internacionais, o Sistema Brasileiro de Garantia dos Direitos da Pessoa Idosa está amparado por diversos documentos legais e planos de ação política que garantem seus direitos, inclusive à não discriminação.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos demarca, sob a ótica normativa internacional, a superação da concepção de que os direitos sociais, econômicos e culturais não são direitos legais. Exemplo disso é a Constituição Federal que, no art. 3°, inciso IV explicita que se deve promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Em seguida, o caput do art. 5° é bastante específico: “Todos são iguais perante a lei, sem discriminação de qualquer natureza”.
Especificamente em relação à discriminação à pessoa idosa o Estatuto do Idoso, em seu Art. 4º, dispõe que “nenhum idoso será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação, violência, crueldade ou opressão, e todo atentado aos seus direitos, por ação ou omissão, será punido na forma da lei”.
A Cooperação Intergeracional, como dissemos, constitui um alicerce de sustentação das políticas, mas também de aprendizagens. Cabe, então, considerar que em toda modalidade de relação há que se ter presente o atuar sem que haja dano.
Um propósito fundamental para que se tenha uma sociedade para todas as idades é promover o diálogo e as relações intergeracionais. Documentos do Plano de Ação internacional de Madri sobre o Envelhecimento (Nações Unidas, 2002) e da Agenda sobre Envelhecimento Colômbia século XXI (2002) podem inspirar sugestões e possibilidades facilitadoras de relações intergeracionais, tais como:
.- Propiciar a educação entre a infância e a juventude e a Adultez, enfatizando a educação permanente, compartilhada ao longo da vida;
.- Estabelecer serviços de saúde que provam cuidado recíproco;
.- Considerar alternativas de trabalho em condições de dignidade e respeito mútuo;
.- Buscar modelos de habitações que promovam a coexistência intergeracional, quando isso seja apropriado do ponto de vista cultural e os indivíduos desejem; estabelecer uma perspectiva ampla e inclusiva da cultura, que leve em conta interesses, gostos e preferência distintos e que, ao mesmo tempo, possibilitem compartilhar intergeracionalmente em diferentes entornos culturais;
.- Construir e adequar espaços inclusivos segundo os interesses e possibilidades que prefiram, e que facilitem o compartilhar entre gerações. Aqui, chamo especial atenção para as “Academias da Terceira Idade” - termo com o qual não concordo, pois que não há primeira nem segunda idade; portanto, não há terceira nem quarta - adquiridas com recursos de Emendas Parlamentares, “compra de votos”, e quase nunca instaladas próximo aos equipamentos de recreação de crianças. Como explicar isto?
Nada do já mencionado se fará realidade caso não se constitua formas de co-educação. Cabe aqui mencionar uma frase, célebre, do pioneiro em educação popular, Paulo Freire (192-1997), que sintetiza o que significa co-educação: “Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, midiatizados pelo mundo. Tal afirmação, junto à educação e aprendizagem permanente, são elementos fundamentais para a co-educação intergeracional, indispensável em um mundo que muda rapidamente.
A partir da segunda metade do século xx se tem falado e comprovado com maior frequência, sobre o distanciamento entre gerações. Entre as possíveis influências estão as políticas que favorecem o distanciamento entre as gerações. A isso podem contribuir, por exemplo, políticas setoriais, instituições sociais, instituições pensadas para idades específicas, Instituições de Longa Permanência para Pessoas Idosas, educação exclusiva ou preferencialmente orientada para a população jovem; oportunidade de palestras, cursos ou trabalho restringidos por idade.
As influências familiares e transacionais, na perspectiva das relações entre avós/os e netos/as, diante das diferenças ou semelhanças de interesses, dependendo das situações e características diversas, podem, em muitas ocasiões, resultar em violências. Isso tem variado de acordo com os tempos, culturas e contextos.
Há desafios imensos, o que faz necessário realizar um exercício investigativo sobre metabolismo geracional, ou mudanças geracionais sobre as trajetórias.
A velhice das próximas gerações será muito diferente da velhice que estão vivendo as atuais gerações. Há que se pensar e estabelecer objetivos nacionais, estratégias e prioridades claras e viáveis de ampliação das políticas de proteção social da população idosa.
Enfatiza-se que as ações voltadas para a pessoa idosa devem ser realizadas com a participação das administrações públicas e através da efetivação de mecanismos de cooperação entre os serviços sociais, o estado e população.
* Pós-Graduada em Psicopedagogia Institucional. Bacharel em Ciências Sociais. Licenciatura Plena em Ciências Sociais. Membro do Grupo de Especialistas da OEA, responsável pela elaboração da Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos das Pessoas Idosas, de 2012 a 2015. Foi coordenadora da área de Direitos da Pessoa Idosa do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos. Presidiu a Comissão Interministerial do Compromisso Nacional para o Envelhecimento Ativo. Presidiu o Comitê ibero-americano sobre a situação das pessoas idosas na região. Organizou e coordenou a publicação de quatro livros: Dez anos do Conselho Nacional dos Direitos do Idoso - repertórios e implicações de um processo democrático. Estatuto do idoso - Dignidade humana como foco. Manual de enfrentamento à violência contra a Pessoa Idosa - Mapa das políticas, programas e projetos do governo federal para a população idosa.
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