Em nome do direito legítimo à sátira,
multiplicam-se nas redes sociais perfis que atribuem, a jornalistas e
políticos, falas e textos que nunca produziram. Estratégia de confusão
salvará um governo atordoado?
OutrasMídias
Publicado 18/02/2019 às 18:19
Por Ethel Rudnitzki, em aPública| Infográficos: Ana Karoline Silano
Gobo News, Mônica Bengamo, Ual notícias, Vilma Russeffi. Trocadilhos
com o nome de veículos de comunicação, jornalistas e políticos são
usados como títulos para usuários de paródia no Twitter. Porém,
autodeclaradas “humorísticas” ou “satíricas”, essas contas divulgam
notícias falsas entre postagens irônicas e críticas à imprensa. Ao longo
de um mês, a Pública analisou 90 dessas contas e descobriu quem são os responsáveis e como se organizam na rede.
Criadas em sua maioria a partir de janeiro de 2018 – das 90
analisadas, apenas 12 foram criadas antes dessa data –, as contas
satíricas ganharam visibilidade no início do ano, quando a Folha de S.Paulo (a verdadeira, não a sátira) denunciou a confusão causada pelas paródias na rede, em matéria publicada no dia 5 de janeiro.
Na ocasião, uma postagem de um perfil de sátira da jornalista Mônica
Bergamo precisou ser desmentida, pois usuários não haviam compreendido
que se tratava de uma paródia. O post dizia o seguinte, imitando o tom
sério usado pela jornalista: “O PT entrou com uma liminar pedindo a
anulação do projeto do Bolsonaro com Israel para acabar com a seca no
Nordeste. ‘A seca no Nordeste é cultural, quase um patrimônio, não deve
ser destruída’, disse Gleisi Hoffmann”. Posteriormente, o tweet foi
excluído.
A presidente do PT foi a público esclarecer que não disse tal
afirmação. A jornalista satirizada também se pronunciou. “Tentam usar a
credibilidade de nosso trabalho jornalístico para enganar as pessoas.
Dizem ser paródia quando na verdade disseminam infos falsas”, publicou em seu perfil oficial no dia 4 de janeiro.
A confusão se deu porque a conta responsável pela postagem utilizava
nome de usuário (@MonicaBengamo, com “N”), foto de perfil e texto muito
parecidos aos do Twitter oficial da jornalista Mônica Bergamo. Além
disso, a sátira simulava o símbolo de perfil autenticado no Twitter,
usando o emoji de um furacão. A matéria da Folha mostrou outras contas
que se utilizavam de estratégias parecidas, como a @STFoficianal, que
ironizava postagens oficiais do STF, entre outras. Muitas delas se
diziam filiadas a um perfil chamado “Central da Imprensa Satírica
Brasileira”, ou CIS, que retuitava suas publicações.
A reação das sátiras
Após as denúncias, o Twitter excluiu mais de
20 contas de paródia. Como resposta, os perfis satíricos se uniram em
torno da hashtag #SátiraNãoÉFake, criticando o que chamaram de censura
do Twitter. Muitas das contas deletadas criaram novos perfis e contas
reservas, se precavendo para o caso de novas exclusões.
A hashtag chegou aos Trend Topics (assuntos mais comentados) do
Twitter no Brasil entre os dias 4 e 8 de janeiro. Ela foi publicada
19.400 vezes, por 11 mil usuários diferentes, conforme análise enviada
pela pesquisadora digital Luiza Bandeira, da organização Atlantic
Council, à Pública.
Dessas publicações, 77,4% foram retuítes, ou seja, republicações de
postagens – um número um pouco acima da média para a rede, mas sem
indício de robotização, segundo Bandeira. Para a pesquisadora, o que
ocorreu foi uma coordenação, não uma automação. “Ela [a repercussão da
hashtag] é orgânica, mas tem alguém que fala ‘ai vamos subir isso?’ É
como um comportamento de fã, tipo um fã clube de um cantor.”
O relatório de Luiza ainda mostra que o tuíte mais compartilhado que
usava a #SátiraNãoÉFake foi a do cantor Lobão, artista popular entre
eleitores de direita e ultradireita, que tem alavancado muitas hashtags
no Twitter. A postagem teve 1.700 retuítes e foi publicada no dia 5 de janeiro, logo após a reportagem da Folha.
O terceiro post com mais interações foi do perfil @SoldadoBolsonaro,
uma sátira da conta oficial do presidente, filiada à Central da Imprensa
Satírica Brasileira. A publicação pedia que os seguidores “subissem” a hashtag através de retuítes.
Muitos dos perfis de paródia excluídos também criaram perfis no Gab,
rede social de ultradireita que permite aos usuários total liberdade de
expressão, inclusive para frases racistas, xingamentos a mulheres e
feministas, insultos a LGBTs, como mostra reportagem da Pública. Das 90 contas analisadas, 10% possui perfil na plataforma.
Uma central para atacar a imprensa
Entre os perfis excluídos pelo Twitter estava o da CIS, um perfil
que, além de publicar suas próprias sátiras, retuitava e divulgava
outras contas de paródia. Depois disso, além de abrir conta no Gab – sua
única postagem foi: “Twitter é uma rede social de esquerdistas
vagabundos” –, a central criou um novo perfil no Twitter com mais
publicações diárias e filiados. Desde o dia 25 de janeiro também, há um
portal com postagens de outras contas de sátira e uma novidade:
“notícias” próprias, dessa vez sem usar do humor. A primeira postagem da
nova conta da CIS foi uma imagem listando 28 perfis de sátira que foram
deletados da rede social e denunciando o Twitter.
No site, eles divulgam 12 perfis de sátira: Soldado Bolsonaro, Portal
Comunista, O Protagonista, UAL notícias, Gaulo Puedes (renomeado para
Jair M. Bolsoarmado), Passarinho Opressor, Revista VistoÉra, Motel?
Privado, Globol, Barril 247, The Comunista e Vilma Russeffi. O
levantamento da Pública mostrou outras 12 contas de paródia que afirmam
fazer parte da Central, ou são constantemente retuitadas pelo perfil da
CIS. São elas: Brasil Independente, Carcada Livre, Cristiane Loba, CBFN,
Estadinho, The Ecomunist, Gerson Camarada, Gobo News, Globobo News,
Merdal Pereira, Instituto CIS pesquisa, e IBGtalvezÉ.
Em entrevista à Pública, os responsáveis pelo site afirmaram
que são cerca de 35 a 40 perfis de sátira filiados, mas eles não
divulgaram exatamente quantas são as contas. Segundo as regras e normas de conduta
publicadas no site, não é permitido divulgar a lista de perfis filiados
para evitar exclusões em massa. Além disso, qualquer perfil pode se
filiar à Central, desde que as contas sigam umas às outras e retuítem
seus conteúdos. As contas também são incentivadas a subir hashtags
consideradas importantes pelos membros, como por exemplo #LulaLivre2043 – em comemoração à segunda condenação do ex-presidente que adicionou outros 12 anos à sua prisão –, que foi utilizada por pelo menos 10 perfis de sátira.
É proibido ainda interagir com hashtags “de esquerda”. “Lembrem-se, não
trabalhamos para a esquerda nem mesmo em tom irônico”, ressalta o
documento.
Mais do que produzir humor, essas contas têm como missão declarada
criticar a imprensa e a esquerda. “Nosso objetivo é informar com
agilidade de forma divertida trazendo a público a desinformação
desnecessária e tendenciosa divulgada em outras mídias”, explicam no site.
Os responsáveis
A Central é coordenada por Alexandre Fernandes Oliveira, ou Alex
Diferoli, como se apresenta no site. O domínio foi registrado em seu
nome pela primeira vez no dia 14 de setembro de 2017. O site entrou no
ar como um portal no dia 25 de janeiro deste ano.
“No fim de 2018 percebemos que vários perfis sátira de direita
começaram a aparecer, e começamos seguir uns aos outros. Decidimos então
criar um perfil que nos representasse. Este perfil cresceu e ideias
diferentes para melhoria e autoajuda entre os perfis começaram a
aparecer. Chegamos a dizer que éramos um “sindicato” e zoamos dizendo
que isso era coisa de comunista”, disse Alexandre em entrevista à Pública.
Ele tem apenas 120 seguidores no Twitter e, apesar de ter conta desde
2009, só começou a postar ativamente no dia 10 de janeiro, poucos dias
depois da exclusão das contas de sátira da plataforma. A partir de então
ele replica manchetes de jornais e retuíta postagens de perfis de
sátira diariamente. No entanto, um outro perfil vinculado a ele,
@arquivoxandy, publica quase diariamente um relatório de pessoas que
visitaram seu perfil, intercalando com publicações anti-PT e
pró-Bolsonaro. Alexandre também assina alguns dos textos no portal da
CIS.
São citados como outros criadores da CIS, Marllon Dionizio, conhecido
nas redes sociais como Dr. Marllão, e Sandra Lima. Cada um deles
administra seu perfil pessoal e possui uma conta de sátira, embora não
digam quais são essas contas. Outros perfis pertencem a pessoas
anônimas.
“Por que eu amo meu Brasil e quero que ele seja o melhor lugar do
mundo pra viver!! Sou Bolsonaro com muito orgulho, cada dia mais!!”
Assim Sandra se apresenta em seu Twitter, com 7 mil seguidores. Em seu Instagram, ela divulga eventos em boates de São Paulo.
Recém-graduado em direito, Marllon é fundador da Aliança Conservadora
Estratégica (Alice), um “movimento que visa unir e organizar pessoas
com o pensamento conservador, além de propagar a defesa e divulgação dos
interesses superiores da nação”. No Twitter, o perfil criado em
novembro de 2018 possui apenas 455 seguidores e segue 16 pessoas. Ele
possui um canal de YouTube sem muita repercussão – apenas 918 inscritos
–, onde publica vídeos sobre política e de apoio a Jair Bolsonaro.
No dia 10 de janeiro, Marllon publicou em seu canal uma entrevista com os administradores de algumas contas paródia excluídas pelo Twitter.
Sem dizerem os nomes ou mostrar o rosto, os entrevistados afirmam ser
independentes e que se conheceram através da rede. Mas o principal tema
gira em torno do repúdio à imprensa.
“A intenção [da criação de contas de paródia] é justamente tirar
sarro da grande mídia. Eles acham que a gente é bobo, fazem toda a
porcaria que fazem e ainda querem que a gente pague por isso. É o que eu
sempre digo, a diferença entre as histórias que a gente inventa e as
que eles inventam é que pelo menos as nossas histórias são engraçadas”,
diz o responsável pelo perfil GI, paródia do G1. “O que eles não aceitam
é que eles fazem a fake news e a gente faz a gozação em cima da fake
news deles. E isso eles não toleram. Eles se sentem perseguidos por
nosso trabalho porque de uma certa maneira a gente expõe de uma forma
engraçada a porcalhada de imprensa que eles estão fazendo ultimamente”,
fala a administradora do perfil “O protagonista”. “Realmente tenho que
concordar com vocês, o nível do jornalismo brasileiro já foi melhor”,
responde na entrevista Marllon.
Alexandre admite que as sátiras geram confusão nos leitores, mas não
acredita que seja responsabilidade delas. “O pessoal confundia a gente
com fake news. Tínhamos nomes, biografia e logo diferente dos perfis
oficiais, sem ter selo de verificação. Portanto, não podem imputar a nós
a propagação de fake news se houve falta de censo crítico, e em alguns
casos até de leitura, por parte dos demais usuários”, afirma.
Procurado, o Twitter não especificou quais foram as regras
desrespeitadas pelos perfis de paródia deletados “devido a questões de
privacidade e segurança”. Segundo sua política específica para contas de paródia, deve-se descrever claramente que se trata de uma conta satírica.
A plataforma diz não monitorar ativamente o conteúdo publicado pelas
contas e só exclui caso haja denúncia de violação dos Termos de Uso.
Para denunciar perfis de paródia, deve-se registrar ocorrência de falsa
identidade ou marca registrada. “No intuito de proteger a experiência e a
segurança das pessoas que utilizam a plataforma, o Twitter tem que
estabelecer os conteúdos e comportamentos que permitimos. Quando tomamos
conhecimento de potenciais violações a essas regras, como conduta de
spam ou evasão de suspensão, fazemos uma análise e adotamos as medidas
cabíveis de acordo com nossas regras e termos de serviço”, disse a
plataforma em nota enviada à Pública.
Os perfis de paródia, contudo, alegam não desrespeitar os termos de
uso do Twitter e consideram as exclusões um ato de censura. “Todas as
contas foram orientadas a deixar bem claro essa informação de que somos
perfil de paródia/sátira na bio, não foram descumpridas as regras e as
alterações solicitadas pelo Twitter foram prontamente atendidas”, afirma
Sandra.
Encabeçadas pela CIS, as paródias criaram uma petição online direcionada ao Superior Tribunal de Justiça.
Eles pedem que o órgão determine a reintegração imediata dos perfis
excluídos e a punição do Twitter, sob o argumento de que a plataforma
agiu contra o princípio da liberdade de expressão garantido pelo artigo
5º da Constituição Federal, ao excluir apenas perfis ligados à direita.
Segundo os perfis que tiveram contas deletadas, o Twitter não deu
explicações sobre o motivo das exclusões. “A exclusão ocorreu por conta
de denúncias oriundas de perfis oficiais, jornalistas e políticos, e
também de militantes de esquerda que se uniram em torno de listas que
divulgamos com os perfis para serem seguidos”, defende Sandra. “Não
descartamos a ideia de mover um processo, pois nos sentimos tolhidos em
nossa liberdade de expressão.”
A causa anti-imprensa
Além da articulação contra a exclusão de contas do Twitter através da
hashtag #SátiraNãoÉFake, as contas de paródia também se organizaram em
campanhas anti-imprensa nas redes sociais. Somente em janeiro, duas
hashtags críticas a jornais brasileiros chegaram aos Trending Topics do
Twitter no Brasil – #GloboLixo e #EstadãoFakeNews. Ambas surgiram após
os respectivos veículos publicarem reportagens que denunciavam aliados
de Bolsonaro.
A #EstadãoFakeNews teve seu ápice no dia 21 de janeiro, em resposta a
uma matéria do jornal que dizia que os eleitores de Bolsonaro haviam se
desorganizado na rede depois da vitória nas eleições. Ofendidos, os
apoiadores, e o próprio presidente, subiram essa hashtag, totalizando
247 mil menções.
De maneira parecida, #GloboLixo chegou a figurar no primeiro lugar
entre os assuntos mais comentados na rede brasileira no dia 22 de
janeiro, após o jornal O Globo ter publicado reportagem que
traçava relação entre Flávio Bolsonaro e milicianos no Rio de Janeiro.
Foram 44 mil menções à hashtag. Entre as postagens mais republicadas
estão duas dele, novamente: o cantor Lobão.
Com menos visibilidade, os perfis de sátira se envolveram nesse
movimento. “Quando gostamos de uma hashtag e sentimos que seja uma causa
que também é nossa, participamos das ações, sim”, afirmou Sandra Lima à
Pública, se referindo às hashtags #EstadãoFakeNews e #GloboLixo.
“Quando você vê as tags #EstadaoFakeNews e #GloboLixo liderando os trends do Twitter, você percebe que está do lado certo da força!”, publicou o perfil Gerson Camarada, sátira do jornalista Gerson Camarotti. A conta foi suspensa pelo Twitter posteriormente.
Sátiras amigas de Bolsonaro
A proximidade do presidente com as sátiras não se restringe ao discurso. Em levantamento, a Pública
analisou 90 contas de paródia no Twitter e concluiu que o perfil
oficial de Jair Bolsonaro foi o mais seguido por elas – 82% das contas
analisadas o seguiam. Entre as filiadas à CIS, todas, exceto pela conta
@PassarinhoOpressor, seguem o presidente.
Em segundo lugar ficou o @Isentões, que se descreve como “a mais
importante conta da plataforma bolsonarista de comunicação no Twitter”.
No dia 5 de fevereiro, a conta foi suspensa do Twitter, mas os responsáveis guardavam um perfil reserva que hoje está ativo e com mais de 240 mil seguidores.
Os filhos de Bolsonaro também estão entre os mais seguidos pelas
contas satíricas. Carlos Bolsonaro ficou em 3º lugar, Eduardo em 6º e
Flávio em 9º. Nos “top 10” também estão personalidades ligadas à
direita, como o humorista Danilo Gentili, em 5º lugar, seguido por 64%
das contas; o músico Lobão, em 8º lugar, com 60% das contas como
seguidores.
E eles seguem de volta. Pelo menos seis, entre os seletos 320 perfis
seguidos por Jair Bolsonaro, são de sátira à imprensa. Até a data de
publicação desta reportagem, ele seguia a Falha de São Paulo, o Blog do
Blabla, The Comunista, Barril 247, G1 (@cor0te), G1 (@fatosesquerda).
O presidente costuma replicar os conteúdos satíricos. No dia 5 de janeiro ele retuitou postagem do The Comunista
que dizia “Bolsonaro começa o dia tornando ilegal qualquer coisa
vinculada ao arco-íris, ursinhos carinhosos, ódio do bem e LGBT”. Ele
também mostrou solidariedade às sátiras excluídas pelo Twitter,
retuitando postagem do perfil Joaquin Teixeira que ironizava a situação.
“Vamos dar boas vindas aos temidos perfis de paródia. Entraram no
seleto grupo que ‘ameaça a democracia’ ao lado da tia da igreja, do
tiozão do churrasco, zap-zap, piadas e feique news”, dizia o post publicado no dia 7 de janeiro.
Para especialistas, paródias confundem
Além da confusão causada pela semelhança entre os nomes de usuário e
fotos dos perfis, alguns perfis de paródia misturam informações reais ou
opiniões editorializadas em meio às sátiras. A própria CIS publica em
seu site matérias e artigos de opinião sem ironia. A primeira matéria
foi publicada no dia 30 de janeiro e mostrava as porcentagens de
seguidores robôs de alguns perfis famosos no Twitter, obtidos através do
aplicativo Twitter Audit. A matéria mostrava que os perfis considerados
de esquerda tinham maior porcentagem de seguidores considerados robôs
do que as páginas de direita, colocando essas páginas sob suspeita.
Contudo, o Twitter Audit não é uma maneira precisa de identificar
seguidores bots, especialmente quando as contas monitoradas possuem
muitos seguidores, pois ele trabalha com uma amostragem de até 5 mil
seguidores, não analisando todos os perfis.
A matéria foi divulgada por muitas das contas de sátira relacionadas à
CIS e teve grande repercussão, sendo curtida pela conta oficial de Jair
Bolsonaro.
No dia 1º de fevereiro, o portal publicou outro texto, dessa vez de
opinião. Tratava-se de um apoio à ministra Damares Alves, alvo de
polêmicas na internet. O texto defende que a ministra está sofrendo
perseguição por militantes da esquerda e pela mídia, e foi assinado por
Sandra Lima, cofundadora da CIS.
“O intuito principal é fazer comédia através das paródias, mas
eventualmente podemos, sim, propagar notícias reais. Em alguns casos, os
usuários acham que até os perfis oficiais [de notícia] são paródia
devido a algumas notícias sem credibilidade e importância”, explica o
fundador da CIS.
As sátiras estão incluídas dentro do espectro de desinformação
desenvolvido pela pesquisadora americana Claire Wardle, do First Draft –
organização que discute a poluição informacional digital. Para ela, as
paródias podem ser enganosas de duas maneiras. A primeira é quando o
conteúdo caminha pelas redes e é retirado de contexto, ele pode
confundir as pessoas. A segunda é quando pessoas usam a sátira para
intencionalmente disfarçar uma informação enganosa. “Chamar um conteúdo
de sátira pode ser usado como tática para confundir o leitor e também os
jornalistas checadores. Afinal, não é possível checar algo que não se
diz um fato.”
Algumas características indicam se o conteúdo se trata de uma sátira
verdadeira ou se apenas está sendo rotulado de sátira como estratégia.
Uma delas é identificar se beneficia apenas uma pessoa ou grupo.
“Verdadeiras sátiras têm como objetivo fazer piadas, tirar sarro,
principalmente sobre política. Mas, se você é um humorista, você vai
querer brincar com quem está na direita e também na esquerda. Você vai
querer fazer humor em tudo que trouxer audiência e conteúdo. Então, se
você se deparar com uma sátira que é apenas boa para um lado ou para
certo assunto, é problemático.”
Mesmo em sites que não têm a intenção de propagar desinformação, a paródia pode ser mal compreendida. Segundo estudo
da Universidade Estadual do Colorado, nos EUA, menos da metade das
pessoas (46,5%) consegue identificar corretamente uma notícia satírica. A
maioria acredita tratar-se de uma notícia séria, ou uma notícia falsa,
sem entender a ironia. “As pessoas geralmente têm sentimentos muito
fortes e ruins em relação à política, e a sátira torna isso mais leve e
atraente”, explica Chianna Schoentaler, uma das pesquisadoras. “Mas, com
a evolução das tecnologias sociais e o surgimento das fake news, as
sátiras também viraram uma forma de confundir.”
“Para mim, sátiras podem fazer até alguém ganhar uma eleição. Uma
campanha inteira pode ser feita em cima de sátiras, manipulando as
pessoas. Afinal, pode-se dizer qualquer coisa ironicamente, dando margem
para a interpretação literal”, afirma Michelle Bedard, coautora da
pesquisa.
A possibilidade de fazer sátiras online ou offline é protegida por
lei através da liberdade de expressão. “A proteção à liberdade de
expressão não anula a proteção à honra das pessoas, então eu posso falar
o que eu quiser, mas eu sou responsável pelo que eu disser ainda que
seja humor”, explica o professor Diogo Rais, professor de direito da
Universidade Presbiteriana Mackenzie e da Fundação Getulio Vargas (FGV).
A situação se agrava se o perfil se passar por outra pessoa, pois o
dano passa a ser intencional. “Tanto o perfil de sátira quanto o perfil
fake trata-se de mentiras, mas o primeiro é uma mentira sem a ideia de
enganar. O que define uma fake news é um elemento que contém uma
falsidade que é proposital e que causa dano a alguém. Só nesse caso o
direito deve agir”, defende Rais.
Para ele, contudo, existem paródias com a intenção de enganar. “Usar a
mesma marca pode ser uma evidência de indução ao erro”, exemplifica
ele.
Ainda assim, deletar os conteúdos nem sempre é a melhor opção,
segundo o especialista em direito digital da Artigo 19, Paulo José Lara.
“Essas derrubadas instantâneas e sumárias de conteúdo não têm o efeito
que se desejaria, que é a diminuição da busca pela desinformação. Pelo
contrário, elas apontaram por uma coesão muito maior desses grupos e de
uma intensificação do ataque à mídia.” Para Rais, a solução também pode
vir dos usuários. “Na internet nós somos curadores do conteúdo, então
também temos um papel de responsabilidade”, conclui.
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