Mais de 90 milhões de brasileiros
beneficiam-se do sistema. Ainda que modestos, pagamentos são essenciais
para reduzir a pobreza – e revelam a enorme potência da lógica de
repartição. Por isso, o ultra-capitalismo não os tolera
OutrasPalavras
Publicado 15/02/2019 às 19:27 - Atualizado 15/02/2019 às 19:31
Por Eduardo Fagnani
MAIS:
Publicado originalmente na antiga revista Brasileiros, em junho de 2015, este texto tornou-se agora ainda mais atual. Por isso, o reproduzimos
Publicado originalmente na antiga revista Brasileiros, em junho de 2015, este texto tornou-se agora ainda mais atual. Por isso, o reproduzimos
A Previdência é um dos pilares da cidadania social brasileira. Entre
2001 e 2012, o total de benefícios diretos do segmento urbano cresceu
48% (passando de 11,6 milhões para 17,2 milhões de beneficiários),
enquanto na Previdência Rural o acréscimo foi de 38% (de 6,3 milhões
para 8,7 milhões). Segundo a PNAD (Pesquisa por Amostra de Domicílio) de
2001, do IBGE, para cada beneficiário direto há 2,5 indiretos (membros
da família). Em 2012, a Previdência Social beneficiou, direta e
indiretamente, mais de 90 milhões de brasileiros.
A maior parte desses benefícios
corresponde ao piso do salário mínimo. Em dezembro de 2012, 46% dos
benefícios pagos aos segurados urbanos (7,9 milhões de beneficiários
diretos) e a totalidade paga aos rurais (8,7 milhões) tinham valor
equivalente ao piso. A expressiva política de valorização do salário
mínimo elevou a renda desse contingente em mais de 70% acima da
inflação.
Os dados da PNAD 2011 revelam que 82,1% dos idosos brasileiros
estavam protegidos pela Previdência Social (a média dos países da
América Latina gira em torno de 30% da sua população).
Estudos do IPEA mostram que, entre 2001 e
2011, a Previdência Social contribuiu com 17% para a queda da
desigualdade medida pelo índice de GINI. No entanto, no subperíodo
2009-2011, pela primeira vez, os rendimentos da previdência apresentaram
a maior contribuição (55%) para a queda da desigualdade, superior à
contribuição do mercado de trabalho (IPEA, 2012).
Em 2009, sem as transferências
monetárias da Previdência, o percentual de pobres (considerando renda
domiciliar per capita inferior a meio salário mínimo) seria de 42,2%.
Com as transferências previdenciárias, esse percentual cai para 29,7%
(Musse, 2010).
Diversos estudos demonstram que as
transferências monetárias da Previdência também produzem impactos
positivos na redução do êxodo rural e na ativação da economia local,
especialmente no caso das regiões mais pobres do País. Além disso, a
experiência dos últimos dez anos demonstrou que a ampliação da renda das
famílias foi peça importante para sustentar a demanda agregada e o
mercado interno, base do crescimento econômico recente.
Esse fato derrubou diversos mitos
sustentados por setores da ortodoxia econômica. Argumentava-se que a
questão financeira da Previdência decorria exclusivamente do aumento
explosivo das despesas. Havia uma única saída: novas reformas para
suprimir direitos.
A realidade confirmou que, ao contrário,
a questão financeira era agravada, sobretudo, pela retração das
receitas em decorrência do baixo crescimento econômico e da crise do
mercado de trabalho verificada entre 1990 e 2002.
Na década passada, o crescimento econômico voltou a ter espaço na
agenda nacional. A forte recuperação do mercado de trabalho
potencializou a arrecadação previdenciária e o segmento urbano voltou a
ser superavitário, fato que não ocorria desde 1996. Isso aconteceu a
despeito da expansão quantitativa dos benefícios, bem como da forte
recuperação real de seus valores, decorrentes da agressiva política de
valorização do salário mínimo. Ao contrário do que sentenciavam os
terroristas do mercado, a recuperação real do salário mínimo não quebrou
a Previdência. Ficou claro que o problema do financiamento refletia
mais diretamente fatores exógenos (política econômica) do que fatores
endógenos ao sistema (despesas com benefícios).
Em 2015, a adoção de uma estratégia ortodoxa de ajuste macroeconômico
poderá conduzir o País para a recessão, com reflexos negativos sobre o
mercado de trabalho. Esse cenário aponta para graves desequilíbrios
financeiros nas contas da Previdência.
Essa passou a ser a senha para novas rodadas de reformas, para suprimir direitos. Hibernados por mais de uma década, os terroristas voltaram a apontar suas bazucas para o setor. A desonestidade intelectual leva-os a bater na velha tecla do suposto rombo financeiro. Para eles, a Previdência incorre em déficit sempre que suas receitas próprias (contribuições de empregados e de trabalhadores) são insuficientes para bancar os gastos com os segmentos urbano e rural.
Essa passou a ser a senha para novas rodadas de reformas, para suprimir direitos. Hibernados por mais de uma década, os terroristas voltaram a apontar suas bazucas para o setor. A desonestidade intelectual leva-os a bater na velha tecla do suposto rombo financeiro. Para eles, a Previdência incorre em déficit sempre que suas receitas próprias (contribuições de empregados e de trabalhadores) são insuficientes para bancar os gastos com os segmentos urbano e rural.
Desconsideram o pacto social selado em
1988, pelo qual a sociedade brasileira decidiu incorporar um contingente
enorme de trabalhadores rurais que começaram sua atividade na década de
1950, sem que tivessem tido direitos trabalhistas e sindicais. Para
corrigir essa injustiça histórica, os constituintes de 1988 criaram
novas fontes de financiamento (como a CSLL e a COFINS), por exemplo, que
integram o Orçamento da Seguridade Social.
Os abutres não levam em conta esse fato.
Nesse modelo, a Previdência também conta com receitas provenientes das
demais fontes de financiamento que integram o Orçamento da Seguridade
Social (Artigo 194). O mais recente estudo publicado pela ANFIP (2012)
revela que o Orçamento foi superavitário em R$ 78 bilhões, a despeito da
DRU (Desvinculação das Receitas da União) e das equivocadas
desonerações fiscais, que afetam gravemente a sustentação financeira do
setor.
A Previdência gasta cerca de 8% do PIB. A
indecente elevação dos juros básicos da economia fará com que, em
breve, as despesas com juros da dívida pública consumam mais de 7% do
produto. A alta dos juros beneficia um seleto grupo de milionários,
investidores, especuladores e rentistas. Por que os críticos não
escrevem uma linha que seja sobre os juros? Desonestidade intelectual ou
conflito de interesses?
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