Peça 1 – a descriminalização do caixa 2
O GGN foi o primeiro órgão de mídia a antecipar a estratégia política
em relação a Lava Jato: a separação dos pagamentos em financiamento
eleitoral via Caixa 2 e a propina propriamente dita (o pagamento em
troca de um retorno objetivo, em geral percentual sobre obras públicas).
A estratégia consistiria em descriminalizar o caixa 2 no segundo tempo
do jogo.
O primeiro tempo foi o da destruição do PT e da destituição da
presidente da República. O segundo tempo seria o do PSDB e demais
autoridades com prerrogativa de foro.
1. O caminho que está sendo montado é o de descriminalizar o
caixa 2 sem permitir a retroatividade, para não beneficiar os réus do PT
e os processos em andamento.
2. Bloquear as delações que possam incriminar lideranças do PSDB nos esquemas de propinas.
3. Montar uma estratégia de convencimento da opinião pública.
Peça 2 – movimentos iniciais
Movimento 1 – a indicação de Alexandre Moraes
O primeiro passo foi a indicação de Alexandre Moraes para o STF
(Supremo Tribunal Federal). Um político polêmico, que pulou por três
partidos em pouco tempo, com um histórico de exibicionismo, é indicado
para o Supremo, onde terá a função de revisor das ações da Lava Jato que
têm como principal réu o presidente que o indicou.
Movimento 2 – a tentativa de cooptação do Ministério Público Federal.
A receita de descriminalizar apenas daqui para diante contentará os
procuradores da Lava Jato que, desde o primeiro momento, se fixaram no
PT como alvo único.
Em 24/11/2016, o procurador Carlos Fernando – o mais jacobino dos
procuradores da Lava Jato - assim se manifestou sobre a proposta de
anistiar o Caixa 2 (http://glurl.co/n6q):
“Pretendem com isso anistiar
a corrupção. Isso acaba com a necessidade da Operação Lava Jato. Não
posso investigar fatos que não são crimes. A partir do dia que essa lei
for sancionada, esses fatos não serão crimes. Pior que isso, vamos ter
que liberar muita gente presa. Vamos ter que liberar condenados do
mensalão. José Dirceu, por exemplo, terá que ser liberado no dia
seguinte a sanção dessa lei”, afirmou Santos Lima, que conclamou a
população a reagir e impedir a aprovação desta e de outras propostas que
criariam um salvo-conduto para corruptos”.
Ontem, em entrevista a O Globo, um novo Carlos Fernando se pronunciou assim sobre a anistia ao Caixa 2 (https://goo.gl/GLsYFM)
Pagamento direcionado a político
a título de bom relacionamento, perto de uma campanha, deve ser tratado
como caixa 2 ou é corrupção?
Neste mundo de pagamentos, temos que
analisar a vontade das partes. Ouvir o depoimento do executivo para que
diga se este pagamento estava vinculado a obra. Não estou dizendo que
todo caixa dois seja crime de corrupção. Mas, se vinculado a uma obra,
explicitamente ou implicitamente, seja ela do passado ou futura, vou ter
que analisar e acho que é corrupção.
Isso não dá ao executivo um
poder de definir o destino dos políticos que estão delatando? Ao omitir
algo como um pagamento feito sem menção à campanha, embora a empresa
tenha sido beneficiada...
É preciso ver as circunstâncias dos
fatos: as reuniões que tiveram, as liberações que aconteceram, o
depoimento de um colaborador é ponto de partida, não de chegada. É com
ele que vamos conseguir analisar os dados.
Mais: elogiou a escolha de Alexandre de Moraes para Ministro do
Supremo, por garantir a manutenção da prisão após julgamento em segunda
instância:
Tínhamos uma preocupação natural com a
posição do novo ministro em relação a temas como a execução de sentença
e o segundo grau. Moraes tem posição que mantém a jurisprudência atual
do Supremo. Por isso, nos sentimos tranquilos em relação à nomeação. É
uma boa escolha, um constitucionalista de respeito.
Escancara-se o jogo político com uma desfaçatez poucas vezes vista na história do país.
Ao mesmo tempo, a sucessão de Rodrigo Janot na PGR, após o fim de seu
mandato, já despertou o campeonato de lisonja entre vários
procuradores. Ficou nítido esse jogo no apoio incondicional do
presidente da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República)
José Robalinho Cavalcanti (http://glurl.co/n6u), à indicação de Alexandre Moraes.
Jurista de notável saber jurídico,
com passagem de mais de uma década pelo Ministério Público do Estado de
São Paulo, Alexandre de Moraes intermediou discussões importantes para o
país à frente do Ministério da Justiça.
Antecessor de Robalinho na ANPR, para obter a indicação para PGR,
enquanto o PT foi poder Rodrigo Janot tornou-se um desenvolvimentista de
carteirinha e um petista por adoção, um apaixonado por José Genoíno.
Foi perceber a mudança de ventos e a absoluta incapacidade da dupla
Dilma-Cardozo de exercitar o poder, para a limalha se deslocar
rapidamente para o polo PSDB e se tornar um antipetista rancoroso –
lembrando a piada sobre jagunços nordestinos que precisam ser tomados de
ódio pela vítima, para matar "por convicção”.
Movimento 3 - o esvaziamento do grupo da Polícia Federal
Nos próximos dias haverá uma ofensiva tripla sobre os delegados da
Lava Jato, especialmente os mais boquirrotos. Inquéritos que se
arrastavam há dois anos – como o caso do grampo ilegal na cela do
doleiro Alberto Youseff – foram acelerados para desfecho breve.
Movimento 4 – a tentativa de blindar o PSDB
A estratégia da descriminalização do Caixa 2 estava montada há
tempos, como se depreende da atuação de Janot no caso OAS, visando
preservar as lideranças do PSDB para se beneficiarem da nova
interpretação.
As duas delações mais aguardadas eram as da Odebrecht e da OAS. A
Odebrecht optou, por tática, revelar apenas os financiamentos via Caixa
2, o que caiu como uma luva na estratégia de preservação dos tucanos.
O presidente da OAS, Léo Pinheiro, dispôs-se a falar sobre as
propinas. E sua delação atingia diretamente Geraldo Alckmin, José Serra e
Aécio Neves, podendo comprometer a estratégia da descriminalização do
Caixa 2.
A maneira de anular a delação da OAS foi primária. Vazou-se para a revista Veja
uma informação irrelevante sobre o Ministro Dias Toffolli. E o PGR
simulou um momento de grande indignação precedendo o cancelamento do
acordo com Pinheiro.
A simulação de indignação foi ridícula:
1. O que mais ocorreu em toda a Lava Jato foram vazamentos e nenhum deles resultou em anulação de delação.
2. Nenhum procurador isento abriria mão de informações preciosas, como maneira de “punir” o delator.
A delação de Léo Pinheiro se tornou um tabu. Ninguém menciona, nem Janot, nem os procuradores da Lava Jato, nem a mídia.
Peça 3 – o imponderável
Embora parte dos movimentos seja combinado, hoje em dia há tal erosão
da disciplina, tal desmanche do país, criando diversas ameaças à
estratégia.
Perda de controle dos vazamentos
Todo o cuidado com que Janot preserva José Serra e Aécio Neves não
foi suficiente. Houve vazamentos de delações da Odebrecht para a
imprensa, colocando ambos no centro dos pagamentos, Serra com o
pagamento de R$ 23 milhões em contas da Suiça; Aécio, com as propinas na
construção da Cidade Administrativa. O vazamento não foi feito por
procuradores ou delegados. Vazando, Janot foi obrigado a agir, mandando
bloquear a conta de Serra na Suíça. E a informação de que Aécio cobrava
percentuais dos gastos na Cidade Administrativa, exigirá do "mineirinho"
Janot malabrismos complexos para varrer para baixo do tapete. A tática
previsível será andar com o inquérito lentamente.
Mesmo agora, com o enorme contingente de procuradores que
participaram da construção das delações da Odebrecht, será impossível a
Janot e à Lava Jato controlar os vazamentos. Daí a adesão tanto de Janot
quanto do procurador Carlos Fernando à tese de de divulgar todas as
delações. Fazendo isso, o controle das ênfases ficará com eles e a
mídia, já que o vazador não terá mais o appeal da informação exclusiva
para oferecer.
Reação do Supremo
O golpe foi articulado por um grupo heterogêneo, do qual participaram:
1. A mídia (basicamente a Globo), como instrumento do mercado.
2. Os dois PMDBs, o de Temer e o de Renan-Jucá.
3. A Lava Jato e o PGR.
4. O PSDB.
5. O STF, Gilmar, mais dez intimidados.
Há uma clara identidade entre Lava Jato-PGR, mídia e PSDB, este como
um mero apêndice, sem qualquer capacidade de formulação ou de
protagonismo.
A reação de Janot à indicação de Moraes foi o pedido de indiciamento
de Renan Calheiros, Romero Jucá e José Sarney, no inquérito em que são
acusados de tentativa de obstruir a Justiça. Aliás, no fim do ano, a
promessa de Janot a amigos de BH era de que até abril o caos estaria tão
grande que dele nasceria a luz de um novo recomeço.
O endosso do Ministro Luiz Edson Fachin, autorizando o indiciamento,
mostra que o Supremo aceita Alexandre, mas não quer perder o
protagonismo. A opinião pública ainda continua fator decisivo.
Aparentemente, poupar-se-á Temer enquanto continuar entregando o
desmanche do Estado social. Mas a decisão de Fachin mostra que o STF não
pretende abrir mão de poder.
O desmanche da Nação
A greve de policiais no Espírito Santo mostra bem os resultados da
Lava Jato – destruindo parte da economia nacional – e da maluquice do
ajuste fiscal indiscriminado em período recessivo.
Há um desmanche amplo da Nação, uma rebelião descontrolada, que se
manifesta na selvageria nos presídios, em Vitória, no Recife, na
possibilidade da greve das polícias atingir outros estados.
Ao mesmo tempo, juízes de primeira instância estão se manifestando em
várias partes do país no episódio Moreira Franco, impedindo a
concretização do pacto por cima.
O que está acontecendo agora é um pequeno ensaio do que o país vai se
tornar com a PEC 55, o arrocho no orçamento e os cortes na Previdência
Social. A tentativa da Globo, através de Mirian Leitão (entrevistando o
desastrado governador Paulo Hartung) mostra que a tática diversionista
será atribuir as crises a setores específicos, anti-modernizantes. Terão
que gastar muita saliva para explicar o alastramento das rebeliões, em
um país convulsionado.
Os economistas estão destruindo o país. Está mais do que claro que
Temer não tem a menor condição de segurar o desmanche. E o PSDB foi
incapaz de apresentar um programa alternativo.
O desmanche social está vindo com a força de um tsunami. Esse poderá
ser o grande fator dos próximos meses a ameaçar no futuro da democracia.
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