O deputado Jair Bolsonaro não estava no ato na avenida Paulista, em São Paulo, em apoio à sua candidatura, neste domingo (21), mas se fez presente através de um telão.
Prometeu ''uma limpeza nunca vista na história desse Brasil''
após eleito. ''Vamos varrer do mapa esses bandidos vermelhos do
Brasil'', afirmou. ''Essa turma, se quiser ficar aqui, vai ter que se
colocar sob a lei de todos nós. Ou vão para fora ou vão para a
cadeia. Esses marginais vermelhos serão banidos de nossa pátria.''
Bolsonaro
não podia ser mais direto. Sua provável vitória, no próximo domingo
(28), abrirá a temporada de caça a adversários políticos e ideológicos e
ao jornalismo crítico e investigativo no país. Ele diz que não manda
ninguém a cometer crime algum. Fato. Mas é a sobreposição de seus
discursos ao longo do tempo que distorce o mundo e torna a agressão
banal “necessária'' para tirar o país do caos e extirpar o ''mal''.
Acaba por alimentar a intolerância, consumida por fãs malucos ou
seguidores inconsequentes que fazem o serviço sujo para a alegria de
seu comandante.
As declarações foram dadas após a repercussão de
um vídeo em que Eduardo Bolsonaro (PSL), deputado federal mais votado
nestas eleições e filho do presidenciável, afirmou que ''para fechar o
STF basta um cabo e um soldado''. Perguntado sobre a possibilidade de o
Supremo Tribunal Federal impugnar a candidatura de seu pai, questionou a
força da instituição e insinuou que militares poderiam agir contra os
ministros. As declarações foram dadas em palestra em Cascavel (PR), no
dia 9 de julho, e viralizaram na rede neste domingo. Jair disse que as
frases foram tiradas de contexto e Eduardo pediu desculpas se ofendeu
alguém, mas falou que a polêmica tinha objetivo de atacar seu pai.
O
fim das eleições já demandaria um exaustivo trabalho de redução de
animosidades e de sinalização ao lado derrotado, se o eleito se
preocupasse em reduzir a tensão. O problema é que, ao que tudo indica,
Bolsonaro não está disposto a trabalhar por isso. Até porque o medo pode
ser um excelente instrumento de governo.
Fábricas de notícias
falsas estão aprofundando a ultrapolarização, levando o país às vias de
fato, incitando a população e municiando-a para o confronto. Pessoas já
morreram, outras ficaram feridas, sendo que os bolsonaristas aparecem
entre os algozes em uma proporção muito maior que os anti-bolsonaristas.
O conflito deflagrado e fermentado pelo rancor ao antipetismo no
período eleitoral pode ser apenas o início. Como venho alertando há
tempos, o day after eleitoral tende a ser simbólica e
fisicamente violento.
O grosso da população, incendiada no período
eleitoral, deve voltar ao ''normal'' após a apuração dos votos da mesma
forma que houve uma descompressão após a votação do impeachment. O que
não significa que parte da sociedade não se mantenha em guerra,
alimentada pelo ressentimento ou pelo não reconhecimento de derrota
eleitoral de seus líderes. E diante disso, a dúvida: com a vitória de
Bolsonaro, grupos radicais, sentindo-se empoderados pela mudança de
governo, vão estar à vontade de ir às ruas, atuando como milícias
políticas, para monitorar e punir opositores do governo, militantes
pelos direitos humanos e jornalistas?
Durante o processo de
impeachment, o ''vermelho'' se tornou a cor errada por um longo tempo,
levando a pessoas que vestisse essa cor fosse punido. A perseguição
ideológica de um certo ''macarthismo à brasileira'' pode se instalar por
aqui atrás dos ''vermelhos'', bem como um clima de caça às bruxas a
toda ideologia que não seja aquela a do poder eleito – que, como não se
enxerga como ideologia, mais ideológica é. Ao invés de acusar inimigos
apenas de comunistas, como ocorreu nos Estados Unidos da década de 50,
pessoas inocentes podem ser tachadas de qualquer coisa e perseguidas por
isso.
Mostrar que o nazismo foi um movimento de extrema-direita
ou falar sobre o golpe de 1964, em sala de aula, pode virar delito
passível de demissão. A parte mais preconceituosa e discriminatória do
politicamente incorreto tende a ser tornar revolucionária na voz de
alguns autointitulados humoristas. Nesse sentido, refugiados e
trabalhadores estrangeiros podem passar a ser alvos de xenofobia ainda
mais explícita, tornando o caso dos haitianos alvejados com projéteis em
São Paulo uma brincadeira de criança. Grupos extremistas pegariam
carona em todo esse processo, usando o contexto para pautar ideias
violentas e absurdas. Jornalistas, sejam eles conservadores ou
progressistas, seriam calados, pelo governo ou por milícias digitais e
convencionais que atuariam livremente, caso não contem a ''verdade'' que
interesse a quem esteja no poder.
No contexto histórico, político
e institucional apropriados, alguém visto como ''normal'' e ''comum''
pode ser capaz de se tornar o que convencionamos chamar de monstro. Ou
seja, os monstros são nossos vizinhos ou podemos ser nós mesmos. Pessoas
que colocam em prática o que leem e absorvem em redes sociais: que seus
adversários são a corja da sociedade e agem para corromper os valores
morais, tornar a vida dos ''cidadãos pagadores de impostos'' um inferno,
e a cidade, um lixo. Seres descartáveis, que vivem na penumbra e nos
ameaçam com sua existência, que não se encaixa nos padrões estabelecidos
do bem. E, portanto, devem morrer.
Uma coisa é uma manifestação que deseja retirar um governo corrupto. Outra é uma que desumaniza o diferente.
Rosa
Weber, presidente do Tribunal Superior Eleitoral e ministra do Supremo
Tribunal Federal, afirmou que ''as instituições estão funcionando
normalmente''. Isso significa que, na opinião dela, o sistema conta com
freios e contrapesos fortes o suficiente para punir distorções na
campanha eleitoral e segurar exageros do futuro Poder Executivo. Depois
disso, o ministro do STF Marco Aurélio Mello reclamou que ''não se tem respeito pelas instituições pátrias'' e que vivemos ''tempos estranhos''.
A falta
de uma resposta forte da Justiça, que estivesse à altura da infeliz
declaração de Eduardo Bolsonaro, até o final da tarde de domingo, deve
ter sido vista pelo presidenciável do PSL como uma demonstração de
fraqueza e, com todo o respeito, covardia do STF.
Sentindo-se solto e leve, deu as declarações do início deste texto.
Após as declarações de Bolsonaro no telão da avenida Paulista, o ministro Celso de Mello, o mais antigo da corte, enviou a Monica Bergamo, da Folha de S.Paulo, a intervenção mais contundente até agora:
“Essa
declaração, além de inconsequente e golpista, mostra bem o tipo
(irresponsável) de parlamentar cuja atuação no Congresso Nacional,
mantida essa inaceitável visão autoritária, só comprometerá a
integridade da ordem democrática e o respeito indeclinável que se deve
ter pela supremacia da Constituição da República!!!! Votações
expressivas do eleitorado não legitimam investidas contra a ordem
político-jurídica fundada no texto da Constituição! Sem que se respeitem
a Constituição e as leis da República, a liberdade e os direitos
básicos do cidadão restarão atingidos em sua essência pela opressão do
arbítrio daqueles que insistem em transgredir os signos que consagram,
em nosso sistema político, os princípios inerentes ao Estado democrático
de Direito''.
Pena que ela não chegou antes. Talvez a percepção
de Bolsonaro sobre a liberdade que terá para limpar, varrer, banir
seria diferente.
Espero que Rosa Weber esteja certa e que as
instituições estejam funcionando normalmente. Porque
os presos, exilados, feridos e mortos por questões ideológicas, a
partir do próximo dia 28, também vão entrar na conta do Poder Judiciário
se os freios e contrapesos falharem.
Post atualizado às 6h do dia 22/10/2018 para inclusão de declaração de Celso de Mello.
Que texto histérico, Sakamoto! Talvez seja melhor você ir buscando um passaporte estrangeiro. Pelo menos, eu não terei de fugir de um novo paraíso comunista, como a sua amada Cuba,ou Venezuela...
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