Descalço
João caminha. Já é noite. Esaú a frente grita:
-
Vamos Joãozinho!!!
O menino
para. Está com medo.
-
Vamos!! O Jacó já tá lá na frente!!
João intimidado
não segue. Atrás de Esaú surge a imagem sinistra da mulher no alto. Bem na copa
das árvore. Ela não tem rosto. Flutua
lutuosamente. João estático força o grito mas som algum lhe sai. Ele tenta em
vão. Esaú olha-o com estranhamento.
- Que
foi?? Fala!!!
João em
um relance olha para as próprias mãos. Elas tem muito sangue. Um grito
alarmante explode a frente. A voz era de Jacó. João olha novamente, a imagem
ainda está no alto, sombria. Esaú vira-se e corre atrás de Jacó para
socorrê-lo. Some da vista do garoto. João fica só.
Ele e
ela frente a frente. O garoto parece tremer com toda sua alma. Não tira os
olhos francos da entidade a sua frente. Um rosnado de cão selvagem e um hálito
quente parecem estar colados ao seu ouvido. O coração dispara. João sente uma
mão roçar-lhe o rosto. Ele grita!
-
Calma João.
João
ergueu o corpo em um solavanco. Não havia mais nada. Apenas imagens desconexas.
Aos poucos reconheceu sua tia Mercedes. Em algum quarto iluminado da pensão
João está deitado em uma cama entre lençóis. O menino boquiaberto recosta aos
poucos a cabeça e fecha os olhos entregando-se ao cansaço. Sua tia acariciava
seu rosto carinhosamente. João olhou mais uma vez para o rosto da tia: Uma pele
morena jambo em um rosto arredondado, olhos levemente amendoados, cabelos
encaracolados e macios, castanhos que pareciam quase avermelhar. Um rosto
familiar. O menino acalmou-se. Sentiu falta do sorriso largo da tia. A única
pessoa que sorria para ele naquela casa. O padrasto talvez. Mas pouco. Os
primos sim. Os primos...
João
escuta ao fundo muitos gritos. Uma voz de mulher descontroladamente brada:
-
Demônio!! Demônio!! Esse demônio matou meus filhos!! Meus dois filhos!! Ahh Meu
Deus!!
Uma
multidão gritava junto com ela e tentava a conter. Assim poderia estar acontecendo
no andar de baixo.
João
segurou a mão da tia que acarinhava seu rosto e se contraiu. Mercedes
apertou o menino. Beijou-lhe a cabeça. Os gritos ressoavam com múltiplas vozes.
Muitas vozes. Cada vez mais alto. Os gritos e choro eram de sua tia Mirtes,
seguramente. João voltou a sentir medo. Seu cansaço, porém o impedia de
perguntar algo. Ouviu algo do tipo... “Maldição!” ou “Maldito”.
O menino
virou o corpo na cama aconchegando-se, sob os carinhos da tia. Quando estava
com o rosto colado ao travesseiro enxergou a cama do outro lado do cômodo.
Sobre ela uma mulher está sentada. Prostrada com as mãos abertas ao lado do
quadril. Olha para ele fixamente com o rosto debulhado de lágrimas. Apenas
olha. Quase sem piscar e com o queixo trêmulo. Era sua mãe. Ela olha para o
filho com uma dor que fez o menino ficar com os olhos totalmente marejados. Sem
mais conseguir se manter consciente, João dormiu.
***
Nenhum comentário:
Postar um comentário