Wikileaks expõe a conexão Lava Jato-EUA, por Outras Mídias
Em 2009, Washington bancou seminário em que
se traçou roteiro para cooptação de juízes brasileiros. No programa, a
troca de informações secretas e toda a tecnologia das “forças-tarefas”.
Entre os conferencistas centrais, Moro
Publicado 01/04/2019 às 17:24 - Atualizado 01/04/2019 às 17:32
Por Luis Nassif, no GGN
O evento seguinte da AJUFE (Associação dos Juízes Federais), financiado pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos,
foi uma continuação do Projeto Pontes, que transformou definitivamente a
Justiça e o Ministério Público Federal em instrumentos de disputas
geopolíticas.
Já havia elementos suficientes mostrando a preparação da Lava Jato
pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos (DoJ). O encontro da
AJUFE despertou pesquisadores, que localizaram um telegrama, no Wikileaks, que descreve com precisão como começou a Lava Jato.
De 4 a 9 de outubro de 2009, foi montado seminário similar no Rio de
Janeiro, com o título “Crimes financeiros”, bancado pelo DoJ, com a
participação de juízes e procuradores de cada um dos 26 estados
brasileiros e do Distrito Federal, mais de 50 policiais federais e mais
de 30 procuradores, juízes e policiais estaduais. Participaram também
membros do México, Costa Rica, Panamá, Argentina, Uruguai e Paraguai.
Foi um seminário de uma semana, sob o álibi genérico de combate ao
terrorismo.
Foi o primeiro evento do Projeto Pontes, cuja missão era consolidar o
treinamento das polícias para a aplicação da lei bilateral. Cuidou-se
de concentrar em trabalhos práticos, evitando os temas teóricos – que,
aliás, poderiam enveredar por aspectos legais da cooperação.
Segundo a nota do Wikileaks, em geral as autoridades brasileiras
preferiam termos mais genéricos, como “crimes transnacionais”, evitando
qualquer referência ao terrorismo. Naquele ano, a conduta mudou. No
telegrama da Wikileaks, anota-se o fato de que, ao contrário das
reuniões com o Ministério das Relações Exteriores e da Justiça, onde se
evitava o termo terrorismo, o público da conferência estava claramente
interessado no tema.
Terrorismo, aliás, a palavra-chave para a cooperação internacional e,
especialmente, para a parceria entre juízes e procuradores brasileiros
com as áreas de segurança do governo americano – leia-se DHS e CIA.
O treinamento foi amplo e prático, incluindo a preparação de
testemunhas. Nas conclusões do seminário estava a necessidade de, no
futuro, as investigações se basearem em forças tarefas, como maneira
mais efetiva “de combater o terrorismo no Brasil”.
Segundo as avaliações do telegrama, o seminário demonstrou claramente
que os juízes federais, promotores e outros profissionais da lei
estavam menos preocupados com o campo minado político e “genuinamente
interessados em aprender como melhor envolver o processo judicial na
luta contra o terrorismo”.
Os dois conferencistas mencionados no telegrama foram o Ministro da
Justiça Gilson Diap e o juiz paranaense Sérgio Moro. Dipp participou por
desinformação; Moro por estar plenamente integrado ao Departamento de
Justiça, por conta da parceria no caso Banestado. Nos debates, o tema
principal versou sobre as sugestões dos brasileiros sobre como trabalhar
melhor com os EUA.
Entre as diversas solicitações, pedia-se treinamento especial sobre a
coleta de provas, interrogatórios e entrevistas, habilidades em
tribunais e o modelo de força tarefa proativa, com a colaboração entre
procuradores e as forças de segurança. Saía-se do campo estritamente
penal, para o campo geopolítico.
Pediram conselhos, também, para mudar o código penal. Os americanos
defenderam mudanças recentes no código, como a exigência do exame direto
das testemunhas pela promotoria e pela defesa, não pelo juiz, e o uso
de depoimentos ao vivo, em vez de declarações escritas. No entanto,
dizia o telegrama, os brasileiros confessaram não saber como utilizar as
novas ferramentas, mostrando-se ansiosos para aprender.
Os especialistas americanos notaram que o fato da lavagem de dinheiro
já estar na alçada dos tribunais federais tornava mais eficaz o combate
à corrupção de alto nível. “Consequentemente”, diz o telegrama, “há uma
necessidade contínua de fornecer treinamento prático a juízes federais e
estaduais brasileiros, promotores e agentes da lei com relação ao
financiamento ilícito de condutas criminosas”.
Sugeriu-se a preparação de um projeto piloto. Os locais ideais, dizia
o telegrama seriam São Paulo, Campo Grande e Curitiba. Apresentou-se o
desenho do piloto: “Forças-tarefa podem ser formadas e uma investigação
real usada como base para o treinamento, que evoluiria sequencialmente
da investigação até a apresentação e a conclusão do caso no tribunal”,
diz o telegrama, corroborando a palestra de Kenneth Blanco, do DoJ, no
Atlantic Council. “Isso daria aos brasileiros uma experiência real de
trabalho em uma força-tarefa proativa de financiamento ilícito de longo
prazo e permitiria o acesso a especialistas dos EUA para orientação e
apoio contínuos”.
A conclusão final do encontro é que o Projeto Pontes deveria
continuar a reunir as forças de segurança americanas e brasileiras em
diferentes locais, “para construir nossos relacionamentos e trocar boas
práticas”. E concluía que, “para os esforços de combate ao terrorismo,
esperamos usar a abertura que esta conferência proporcionou para
direcionar o treinamento de forças-tarefa de financiamento ilícito em um
grande centro urbano”.
Nos anos seguintes, DHS, DoJ e CIA forneceram informalmente os
elementos centrais que permitiram ao juiz Sérgio Moro, a partir de
Curitiba, conduzir uma denúncia de corrupção ocorrida no Rio de Janeiro,
tendo como personagens centrais pessoas de Brasília e São Paulo.
Conferiu a juízes e procuradores o “abra-te Sésamo”, a informação
provinda dos serviços de espionagem eletrônica americano, que lhes
garantiu poder, glória e um protagonismo político inédito.
A consequência foi a destruição de parte relevante da economia
brasileira, desmonte do sistema político e das instituições
democráticas, permitindo à Lava Jato se tornar sócia do poder, através
de seu aliado Jair Bolsonaro. E jamais apareceu um terrorista de verdade
para justificar a parceria. O então Ministro da Justiça Alexandre
Moraes precisou inventar terroristas de Internet.
É inacreditável que um evento tão ostensivo como este tenha passado
despercebido do governo Lula, na época, cego pelo sucesso que marcou seu
último ano de governo. Gostou do texto? Contribua para manter e ampliar nosso jornalismo de profundidade:OutrosQuinhentos
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