O país arrecada impostos na casa dos trilhões de reais, mas isso não
tem sido suficiente para financiar o Estado brasileiro, nas três
esferas. Os municípios reclamam de falta de recursos e dependência do
governo federal, os Estados têm dívidas e a União busca novas formas de
aumentar a receita.
No Brasil, uma reforma da estrutura tributária
é discutida há pelo menos duas décadas. Propostas feitas pelo
Executivo, porém, avançam pouco no Congresso. Enquanto isso, o país
continua lidando com os custos de ter um sistema de cobrança complexo e, em muitos casos, desproporcional.
No
momento em que se discutem os gastos e a arrecadação do governo, é
importante entender a história dos tributos, como e por que eles são
arrecadados e utilizados pelo poder público.
O QUE são tributos
Ninguém
gosta de pagar impostos, mas não é uma questão de escolha. Nunca foi. A
própria origem da palavra, em latim, remete a imposição. Imposição do
Estado aos cidadãos que vivem e desfrutam dos benefícios de um ambiente,
em tese, organizado, seguro e que pune os excessos.
São esses
recursos que mantêm em funcionamento o poder público. Eles financiam
saúde, educação, policiamento, infraestrutura e toda a máquina estatal.
Impostos, taxas e contribuições são os três tipos de tributo existentes hoje no Brasil.
Os
impostos são os tributos permanentes e obrigatórios. Pelo recolhimento
do lixo ou pela iluminação pública, por exemplo, se pode cobrar uma
taxa. Além disso, quando o Estado faz alguma melhoria ou obra, pode
exigir uma contribuição extra.
Criar tributos é uma atribuição do
Executivo, ou seja, Presidência da República, governos estaduais ou
prefeituras. Mas para isso é preciso a autorização do Legislativo. Os
impostos são criados, basicamente, de duas maneiras: por lei ordinária
ou complementar.
Taxas e impostos previstos na Constituição podem ser criados por lei ordinária, que deve ser aprovada por maioria simples
(metade mais um dos presentes) em uma votação na Câmara ou no Senado.
Já impostos não previstos e contribuições precisam de lei complementar,
somente aprovada por maioria qualificada (metade mais um do total do
colegiado - no caso da Câmara dos Deputados são 513).
Fonte da renda
QUANDO os impostos começaram a ser cobrados
O
início da cobrança de tributos se confunde com a organização do ser
humano em sociedade. O termo tributo vem do latim e significa “repartir
entre tribos”. Ele era pago a líderes e guerreiros que protegiam as
pessoas de ataques inimigos. É o embrião do Estado de direito.
No
Egito e na Grécia, porém, quem pagava compulsoriamente eram os povos
dominados. No Império Romano, somente os não romanos financiavam a
máquina burocrática do Estado.
Durante o período feudal, quando a
noção de Estado não estava consolidada, os tributos eram pagos aos
senhores. O surgimento dos Estados nacionais e o crescimento das cidades
tornaram a cobrança mais parecida com os dias atuais, com os governos
provendo o mínimo de infraestrutura para a vida dos contribuintes.
QUAIS as duas teses gerais sobre o pagamento
É
difícil imaginar uma sociedade contemporânea sem a organização estatal.
As discussões se dão, quase sempre, sobre qual deve ser o tamanho do
Estado. Seja ele mínimo ou que promova o bem-estar social, ele depende
de recursos.
Os que defendem o Estado mínimo consideram o poder
público pouco eficiente na gestão dos recursos (por corrupção,
desperdício etc.) e preferem que as ações fiquem na mão da iniciativa
privada.
Já o Estado de bem-estar social garante ao cidadão a
universalização de direitos como saúde, educação e aposentadoria, entre
outros. Esse modelo, muito presente em países europeus, custa caro e
exige carga tributária elevada. É nele que está baseada a Constituição
brasileira.
QUEM paga mais impostos no Brasil
No Brasil, a carga tributária pesa mais para os mais pobres. Isso acontece pela forma como se dá a cobrança.
O país tem 92 tributos
diferentes, segundo a consultoria Portal Tributário. São tributos
municipais, estaduais ou federais, incidentes sobre a renda do cidadão, a
produção ou a circulação de mercadorias. Alguns atingem parcelas muito
específicas da população, outros são quase universais.
Eles podem
ser diretos, como o Imposto de Renda pago por qualquer pessoa que ganhe
mais de R$ 1.903,98 por mês. Ou indiretos, como o IPI que incide sobre
produtos industrializados e que vêm embutidos no preço final da
mercadoria.
A cobrança de alguns tributos é progressiva. Ou seja, a
alíquota aumenta de acordo com a renda ou o faturamento. No Imposto de
Renda, por exemplo, a alíquota varia entre 7,5% e 27,5%, de acordo com a
renda do contribuinte.
Os impostos indiretos têm alíquota fixa, o
que os torna mais pesados para os que ganham menos. O ICMS (Imposto
sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) embutido no pão, por
exemplo, é o mesmo para quem ganha R$ 880 ou R$ 10 mil mensais.
Estudo feito pelo Tesouro Nacional
em 2008 mostra que a carga tributária brasileira é regressiva à medida
que se aumenta a renda. Ou seja, quanto mais se ganha, menos se paga
imposto, em termos proporcionais.
Pela pesquisa, famílias com
renda de até dois salários mínimos gastavam 27,85% do que ganhavam com
impostos. Na faixa mais alta pesquisada, com renda maior que 30 salários
mínimos, os impostos comprometiam 18,49%.
Um levantamento feito pela consultoria PwC (PricewaterhouseCoopers) para a BBC mostra que os ricos no Brasil pagam impostos mais baixos do que a maioria dos países do G20.
ONDE há melhor retorno dos impostos
Mais
de R$ 2 trilhões foi o valor que o contribuinte brasileiro pagou aos
governos municipais, estaduais e federal em 2016. A carga tributária
representou, naquele ano, 33% do PIB (Produto Interno Bruto).
Baseado
no percentual de impostos pagos, o IBPT (Instituto Brasileiro de
Planejamento Tributário) fez um levantamento e colocou o Brasil em
último lugar de uma lista de 30 países que mede o retorno dos impostos.
No
índice, uma relação entre carga tributária e IDH (Índice de
Desenvolvimento Humano), o Brasil aparece atrás, por exemplo, da
Irlanda, Uruguai e Argentina. Os dados usados pelo IBPT são de 2013,
antes do início da crise no Brasil.
Por esse critério, que leva em
conta o tamanho da carga tributária e o retorno ao cidadão, a Autrália
aparece no topo, seguida pela Coreia do Sul. Agora, veja este gráfico,
que leva em conta só a carga tributária.
No mundo
O quanto o brasileiro paga de imposto cresceu desde a implantação do Plano Real. Em 1994, a carga era de 28,61%.
Crescente
POR QUE o imposto, se bem cobrado, é algo justo
A
grande preocupação dos legisladores deve ser criar impostos que ajudem a
sociedade de alguma maneira. Um exemplo é tributar mais as indústrias
que poluem. Além de ser um recurso extra para o Estado, que pode,
eventualmente, ser usado para mitigar os efeitos da poluição, é um
incentivo para que as empresas diminuam a emissão de poluentes que
afetam outras pessoas que nada têm a ver com o negócio. O mesmo vale
para a tributação do cigarro e de bebidas alcoólicas.
Os impostos
sobre a renda, por exemplo, que têm alíquota crescente de acordo com o
rendimento das pessoas, podem ser uma maneira de diminuir a
desigualdade. Esses recursos podem financiar o acesso de crianças pobres
à educação e garantir que ricos e pobres tenham oportunidades mais
parecidas.
O grande problema do tributo mal cobrado é que ele inibe investimentos, contratações e compras.
COMO melhorar o sistema tributário brasileiro
Reforma tributária não significa, necessariamente, cobrar menos
impostos. Significa mudar quanto cada um recebe e paga. O problema é que
ninguém quer perder recursos ou pagar mais tributos. E é aí que a
discussão da reforma emperra.
O desafio dos que tentam mudar a
forma como se cobram tributos é tornar o sistema mais simples e
eficiente. Outras propostas tentam reduzir a carga tributária. Os
presidentes Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva
tentaram emplacar reformas amplas no sistema tributário nacional, mas
falharam.
Depois dos fracassos, ganhou força a ideia de que era
mais fácil fazer pequenas mudanças pontuais no sistema. Atualmente, há
uma comissão encarregada de discutir a reforma na Câmara, mas ela não
conseguiu promover uma mudança estrutural. Faz o que se chama de reforma
fatiada.
As ações do governo Dilma até agora se limitaram a
tentar simplificar a cobrança - o que não deixa de ser um avanço já que a
complexidade do sistema é uma das causas de sua ineficiência.
O
Simples nacional, válido para micro e pequenas empresas, é um exemplo
disso. Nele, o contribuinte faz apenas um pagamento referente a diversos
tributos municipais, estaduais e federais.
O ICMS é um dos
grandes entraves da reforma tributária. Isso porque cada Estado cobra
sua alíquota, o que criou a chamada guerra fiscal. Isso acontece quando
um Estado baixa sua alíquota para atrair empresas do vizinho. No médio
prazo, para competir, os Estados são forçados a baixar as alíquotas e a
arrecadação cai.
A alíquota ainda não foi unificada, mas, desde o
primeiro dia de 2016, a cobrança do principal tributo estadual está
mudando. A ideia é amenizar a guerra fiscal cobrando o imposto no
destino e não mais na origem do tributo. A mudança vai ser gradativa até
2019, quando 100% do ICMS irá para os cofres do Estado consumidor.
Além
de combater a guerra fiscal, a ideia da proposta é desconcentrar a
arrecadação, que até 2015 tinha como maiores beneficiários Estados
produtores do sul e do sudeste do Brasil.
EM ASPAS
"Por que não foi aprovada? Porque as pessoas não querem. Cada um quer a sua própria reforma, cada Estado e cada município, quer a sua própria reforma e ela acaba não acontecendo"
"Sou cético que uma reforma consiga tornar esse sistema mais eficiente. Nós precisamos é de outro sistema tributário, afinal, o atual fará 50 anos em breve e o mundo e o Brasil mudaram. Já passa a hora de reestruturar o sistema e não apenas tentar consertar suas distorções."
"Pagar impostos é um ato de cidadania. Um país com cidadania ampliada é um país que tem uma carga tributária elevada. O Brasil tem uma carga tributária elevada, mas não significa dizer que tem cidadania plena. A arrecadação tributária aprofunda a desigualdade porque os mais pobres pagam mais impostos relativo a sua renda enquanto os ricos pagam muito pouco"
“Acho que tem muito imposto excessivo, o que está errado é a despesa pública. Essa é uma realidade que o setor político tem sempre muito medo de encarar. Parece mais fácil aumentar receita do que reduzir despesa. Mas felizmente já está se verificando que não é tão fácil aumentar imposto, isso é um progresso.”
NA ARTE: Filmes e livros
A Economia Política da Reforma Tributária: o caso Brasileiro
Estudo do economista José Roberto Afonso mostra os entraves políticos à reforma tributária no Brasil.
Robin Hood
O heroi que rouba dos ricos para distribuir aos pobres se rebela, inicialmente, contra a cobrança abusiva de impostos.
Taxman
A música,
escrita por George Harrisson, está no álbum "Revolver". Àquela altura,
em 1966, os Beatles percebiam que boa parte da fortuna acumulada nos
três primeiros anos de sucesso havia sido destinada ao pagamento de
impostos.
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