Brasília hoje lembra a Versalhes de antes da Revolução
Francesa: uma corte com seus privilégios de um lado e o povo, de outro,
obrigado a trabalhar e pagar os impostos que sustentavam o clero e os
nobres, escreve Helena Sthephanowitz, em seu blog na Rede Brasil Atual
Consumado o golpe que tirou o mandato da presidenta eleita, Dilma
Rousseff, o país está dividido entre a capital federal, de um lado, com
seus poderes formais ocupados por Vossas Excelências – que renegam o
voto popular e impõem um programa de governo derrotado nas urnas –, e de
outro, o resto do Brasil, os 99% que estão sem quem os represente.
Brasília hoje lembra muito a Versalhes pouco antes da Revolução
Francesa. Uma corte composta pelo clero que se identificava com a
nobreza e a própria nobreza, incluindo a togada, com seus privilégios.
Todos eles mal chegavam à 2% da população francesa. Aos outros 98% do
povo cabia trabalhar como burros de carga para levar uma vida miserável e
oprimida a pagar os impostos que sustentavam a Corte, já que o clero e
os nobres não só eram isentos de impostos como viviam às custas do
Tesouro.
Dois anos antes da queda da Bastilha, o rei Luiz XVI, enfrentando uma
crise econômica, tentou convencer o clero e os nobres a contribuírem
com impostos. Não quiseram ceder os anéis para não perder os dedos. Dois
anos depois, deu no que deu. Brasília também não aceita sequer um
governo trabalhista e popular legitimamente eleito, se recusa a fazer
uma reforma política que empodere o povo e faça as transformações
desejadas, se recusa a tributar grandes fortunas, dividendos e, pior,
promove uma volta às políticas de concentração de renda para os mais
ricos, depauperando a população mais pobre e a classe média. Temer
ficará no lucro se conseguir ter os dois anos que Luiz XVI teve antes da
queda da Bastilha.
O vácuo de poder popular só pode ser preenchido por lideranças que
aglutinem seus anseios. Lula ainda é a maior liderança, apesar da
perseguição implacável que sofre. Afinal todo o povo quer de volta um
governo como o que Lula fez, principalmente se for sem o contrapeso que
foi necessário à governabilidade de oportunistas traidores, safados e
corruptos que a Justiça Eleitoral diploma como se tivessem a ficha
limpa.
Dilma também tem seu papel. Livre das amarras da governabilidade com
forças políticas hostis aos interesses públicos, deposta pelo que uma
caricatura do New York Times desenhou ser um bando de ratos, tem
credibilidade para contar ao povo "como são feitas as salsichas" na
política, ou seja, apontar os defeitos e caminhos para as transformações
políticas, livrando da banda podre que, ao que tudo indica, só tem
conserto pra valer com novas eleições diretas para presidente, seguida
de uma nova Assembléia Nacional Constituinte exclusiva, com delegados
eleitos diretamente pelo povo, sem a participação de atuais e futuros
parlamentes, para não legislarem em causa própria, e com as principais
regras propostas sendo levadas a plebiscito para a população decidir
diretamente sem intermediários.
Mas não é só Lula e Dilma que podem preencher o vazio de poder
deixado por Brasília. Aliás nem prender e arrebentar ambos para
aniquilá-los, como tentou a ditadura no passado, adianta. Ainda pode
parecer invisível, mas nos últimos 13 anos cresceram milhares de Lulas e
Dilmas que, como disse o senador Roberto Requião (PMDB-PR), não
retornarão submissos à senzala.
A farsa do golpe foi tão grande que Dilma foi destituída por suposto
crime de responsabilidade mas, imediatamente depois foi absolvida dos
supostos crimes, ao não a condenarem à perda de direitos como ocorreu
com Collor. Ora, se houvesse convicção de fato de que houve crimes de
responsabilidade, deveria haver convicção suficiente para impor a pena
cabível, o que não foi feito. É a consciência pesada de quem fez uma
injustiça e a confissão de parte do Senado de que Dilma sofreu de fato
um golpe parlamentar, como ela diz e toda a imprensa estrangeira vê.
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