oto: Jung Yeon-Je/Reuters - 27.07.2017
Representantes dos governos da Coreia do Norte e da Coreia do Sul darão início
nesta terça-feira (9) a uma rodada de diálogo na cidade de Panmunjom,
na zona desmilitarizada que, desde a década de 1950, separa os dois
países.
O encontro – o primeiro deste tipo em dois anos – é visto
como uma promissora janela de oportunidade para abrir um caminho que
possa levar ao fim da tensão nuclear que domina o sudeste asiático.
A
Península Coreana foi dominada pelo Japão de 1910 a 1945. Após a
Segunda Guerra Mundial, os soviéticos passaram a controlar o norte,
comunista, e os EUA, o sul, capitalista. Coreanos das duas partes se
engajaram numa guerra por procuração entre 1950 e 1953. A separação
persiste até hoje, com os dois lados vivendo uma situação formal de
“armistício”, que é a suspensão das hostilidades, mas não de paz
definitiva.
As raízes do programa nuclear norte-coreano, que tanto
preocupa o mundo todo, vêm de 1962, quando o país começou a desenvolver
essa tecnologia, com apoio soviético e chinês. Em 1986, a Coreia do
Norte construiu sua primeira usina nuclear e, entre os anos 1990 e 2000,
o regime norte-coreano importou cientistas saídos das ex-repúblicas
soviéticas, que começaram a ruir a partir de 1991. Esses cientistas
nucleares levaram o país a dominar a tecnologia da qual dispõe hoje,
para fabricar ogivas atômicas e lançá-las com mísseis balísticos capazes
de chegar até os EUA.
É nessa linha do tempo e nesse contexto que
se insere o diálogo entre os dois países em Panmunjom em 2018. A razão
manifesta, entretanto, é bastante mais prosaica: norte-coreanos e
sul-coreanos discutirão uma possível participação do lado comunista na
Olimpíada e Paralimpíada de Inverno, que ocorre na cidade sul-coreana de
Pyeong Chang, de 9 a 25 de fevereiro.
Agenda aberta e agenda oculta
O
sinal verde para o encontro partiu do líder norte-coreano, Kim Jong-un,
em seu discurso de Ano Novo, na virada de 2017 para 2018.
Num
mesmo pronunciamento, ele disse que se considerava “aberto ao diálogo”
com o sul, mas advertiu que mantinha na mesa de trabalho o botão capaz
de acionar o arsenal nuclear do país. A fala deu o tom que domina essa
janela de oportunidade, situada entre a esperança de paz e a
desconfiança mútua.
O “episódio do botão” tornou-se conhecido
também pela réplica do presidente dos EUA, Donald Trump, que, em
Washington, disse que tinha “um botão maior” que o de Kim Jong-un.
A
capacidade militar norte-coreana faz com que muitos países temam o
risco de ataques a suas delegações, durante os jogos, na Coreia do Sul.
Por isso, discutir uma agenda comum durante a Olimpíada é importante,
como parte de uma estratégia de distensão.
Os sul-coreanos se
mostraram dispostos a financiar a participação dos vizinhos do norte nos
Jogos, como sinal de abertura, boa vontade e disposição para a
cooperação. Por causa do programa nuclear, a Coreia do Norte é um dos
países mais sancionados do mundo, o que dificulta a entrada de bens e de
serviços no país.
77%
Dos sul-coreanos são favoráveis à participação dos norte-coreanos nos Jogos de Inverno, de acordo com o Realmeter
54%
Dos
sul-coreanos acham que seu próprio governo deveria financiar a
participação dos norte-coreanos nos Jogos de Inverno, de acordo com o
Realmeter
Além da ajuda financeira, há propostas ainda mais
ambiciosas, envolvendo os Jogos. Uma delas é sobre a possibilidade de
que delegações dos dois países desfilem juntas nas cerimônias de
abertura e de encerramento.
Além disso, os dois países podem
discutir até mesmo a possibilidade de que, em algumas categorias,
sul-coreanos e norte-coreanos compitam como membros do mesmo time.
Essa,
porém, é a agenda pública do diálogo. Enquanto isso, temas mais
sensíveis vêm sendo tratados nos bastidores. Um desses temas é a
possibilidade de promover a reunificação de famílias separadas pelo
conflito de 1950-1953, que vivem dos dois lados da fronteira.
A
outra possibilidade é a de que a Coreia do Sul possa – a despeito do
embargo e das sanções – concretizar o envio dos US$ 8 milhões que havia
prometido ao norte, por meio da Unicef, a agência das Nações Unidas que
cuida de crianças e adolescentes no mundo.
Por fim, há outras duas
teorias sobre a real motivação do norte para o encontro. Uma delas diz
respeito a uma estratégia atribuída a Kim de, ao se aproximar do sul,
deixar de lado Trump, que é percebido como um ator indesejado nas
negociações.
Há também uma teoria mais desconfiada, que é a de
que, no fundo, com esse diálogo, a Coreia do Norte só quer ganhar tempo
enquanto, na verdade, acelera seus testes de mísseis balísticos e de
ogivas nucleares.
O trágico antecedente de 1988
Em 1988, a Coreia do Sul sediou a Olimpíada (não a de inverno, mas a de verão, a convencional).
Um
ano antes, em 1987, dois agentes secretos norte-coreanos plantaram uma
bomba dentro do voo 858 da Korean Air que fazia o trajeto de Bagdá para
Seul, com escala nos Emirados Árabes.
O avião explodiu em pleno
voo, matando 115 pessoas. O episódio acentuou o distanciamento entre os
dois países e ajuda a explicar parte do temor com os Jogos de Inverno
que se aproximam.
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