Direito de Lula se candidatar é linha divisória entre democracia e golpismo
por Luís Felipe Miguel
É muitíssimo improvável que Lula não venha a ser condenado no próximo dia 24.
O que tem acontecido em Porto Alegre, assim como em Curitiba, não tem
nenhuma proximidade com justiça. Não serve nem como farsa. É um
deboche.
No momento em que foi anunciada a data do julgamento, atropelando
prazos e bom senso, a coalizão golpista já tinha tomado a decisão de
condenar o ex-presidente. Os desembargadores, sem jamais abandonar a
empáfia que os caracteriza, cumprem seu papel numa trama na qual são
meros peões.
Não há nada que justifique a condenação de Lula. Há muito o que
criticar em sua trajetória, mas depois de anos de devassa em sua vida
não surgiu nenhuma prova de ilícito. As evidências que abundam no caso
de outros, como Aécio Neves, Michel Temer, José Serra ou mesmo o homem
que se fantasia de "reserva moral da república", Fernando Henrique
Cardoso, estão simplesmente ausentes no caso de Lula.
Seus acertos e seus erros devem ser submetidos a um julgamento
político. O verdadeiro, das urnas, não o julgamento politizado de falsos
juízes.
Ao definir que Lula deveria ser impedido de concorrer, a coalizão
golpista decidiu apressar o passo no sentido do fechamento do regime. O
ex-presidente representa a melhor aposta possível para uma reconstrução
pouco traumática de algo que se aproxime da "normalidade democrática",
acomodando interesses e repactuando compromissos. É duvidoso se tal
estratégia é correta (eu mesmo julgo que não), mas é seu direito
apresentá-la.
Afinal, é disso que se trata: não apoiar ou deixar de apoiar a
candidatura do ex-presidente, mas de entender que o veto a ela marca a
eleição de 2018 com uma ilegitimidade intransponível.
Tirando Lula do páreo, a coalizão golpista mostra que está disposta a
abandonar qualquer fachada de democracia e não se dispõe a negociar
nada, nada mesmo, com a maioria do povo brasileiro. Sua bandeira parece
ser: "nenhum retrocesso a menos". Para protegê-la, está pronta a
sacrificar qualquer pretensão à legitimação popular de seu mando.
É pouco provável, já disse, que no dia 24 surja um veredito diferente
da condenação. Depois disso, talvez - mas só talvez - a reação da
sociedade os obrigue a procurar brechas que permitam uma candidatura
instável, sub judice, para evitar um confronto maior, mas mantendo Lula
frágil e acuado.
Isso não depende de retórica jurídica, de provas, de hermenêutica
legal. Não é como se fosse uma disputa na justiça. Depende de
mobilização, de capacidade de resposta. É muito mais do que a
candidatura de Lula que está em jogo. É se vamos continuar deixando o
golpe avançar ou se vamos começar a dar um basta.
Por isso, a defesa intransigente do direito do ex-presidente a se
candidatar é muito maior do que o PT e o lulismo. É uma linha divisória
entre democracia e golpismo.
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