A ópera do impeachment vai chegando a uma segunda onda decisiva, com o
vale-tudo que se instaurou envolvendo os dois principais personagens da
trama: a organização comandada por Michel Temer; e a organização
influenciada pela Rede Globo.
Do lado da Globo alinha-se a Procuradoria Geral da República e a Lava
Jato. Do lado de Temer, o centrão, o Ministro Gilmar Mendes, do STF
(Supremo Tribunal Federal), alguns grupos de mídia, como a Rede Record, e
provavelmente políticos jogados no fogo do inferno, como Aécio Neves.
No pano de fundo, o agravamento da crise, com um plano econômico
inviável aplicado por economistas radicais valendo-se do vácuo político.
E, fora das fronteiras, ventos complicados ameaçando botar mais lenha
na fogueira.
O caos – que irá se ampliar nos próximos dias – é resultado direto da
quebra da institucionalidade, com a Lava Jato e o impeachment. No
mínimo servirá para que cabeças superficiais, como o Ministro Luís
Roberto Barroso, se deem conta da imprudência que cometeram ao cederem
às pressões especialmente da Rede Globo.
Aliás, quando os pecados da Globo estiverem à mostra, não se espere
do bravo Barroso nenhuma declaração de fé irrestrita no combate à
corrupção e de apuração até o final, doa a quem doer. Voltaremos a
conviver com um garantista, cuja sensibilidade em defesa dos direitos
será enaltecida pela Globonews, o espelho, espelho, seu.
Os próximos capítulos contêm pólvora pura:
Peça 1 – a Globo sob pressão
Pela primeira vez, desde a redemocratização, a Globo encontra um
poder à sua altura, isto é, sem nenhum prurido, disposto a se valer de
todas as armas à mão para encará-la. Uma coisa foi aliar-se ao
Ministério Público Federal (MPF) para conspirar contra Lula e Dilma e
sua incapacidade crônica de se valer dos instrumentos de poder. Outra
coisa, é enfrentar pesos-pesados, pessoas do calibre e da falta de
escrúpulos de um Eliseu Padilha, Aécio Neves.
Temer e sua quadrilha tem a força da presidência. E quem os colocou
lá foram justamente a Globo, a Lava Jato e a PGR. Agora, a mão e as
verbas do Planalto estão por trás dos ataques da TV Record à Globo. Ou
julgaram que o pior grupo político da história aceitaria ir para o
patíbulo sem se defender?
Não apenas isso.
Ontem, a Justiça espanhola emitiu uma ordem de prisão e captura contra Ricardo Teixeira,
ex-presidente de CBF, por corrupção praticada no Brasil. E, no centro
da corrupção, a compra dos direitos de transmissão da Copa Brasil pela
Globo, com pagamento de propina.
O carnaval feito pela Globo, com a delação da JBS, visou justamente
abafar a divulgação de seu envolvimento com o escândalo, levantado pelo
Ministério Público Espanhol e pelo FBI.
No “Xadrez de como a Globo caiu nas mãos do FBI”
detalhamos esse caso, mostrando como, no início da Lava Jato, já havia
indícios de que o FBI já tinha a Globo nas mãos, a partir da delação de
J.Hawila, o parceiro da emissora na criação do know-how de corrupção de
compra de direitos de transmissão, posteriormente levado por João
Havelange para a FIFA.
Peça 2 – o nó da cooperação internacional e o PGR
Encrenca grande também aguarda o PGR Rodrigo Janot, em visita aos Estados Unidos.
Nos próximos dias deverão aparecer pistas de operações de cooperação com o FBI onde
ficará mais claro a montagem de uma parceria supranacional que afronta
explicitamente a noção de soberania nacional. É possível que o PGR tenha
pedido ajuda do FBI contra um presidente da República. Se confirmado,
cria-se uma crise aguda, com o atropelo inédito à soberania nacional,
mesmo que na ponta investigada esteja um político desqualificado como
Temer.
Além disso, exporá ainda mais a cumplicidade da PGR com a Globo,
especialmente se nada for feito em relação a Ricardo Teixeira. Poderia
um PGR entregar um brasileiro para ser julgado pela Justiça de outro
país, por crimes cometidos aqui? Pelos princípios de soberania nacional,
de modo algum.
Mas como se explicaria o fato dos crimes jamais terem sido apurados
no Brasil, nem no âmbito da cooperação internacional? E, ao mesmo tempo,
se ter valido da cooperação internacional contra presidentes da
República?
Como se explicaria a enorme blindagem de Ricardo Teixeira que, no fundo, significa a blindagem às Organizações Globo?
Quando começou a ficar claro a falta de regras e de limites para a
cooperação internacional, prenunciamos aqui que mais cedo ou mais tarde o
PGR seria submetido a um julgamento por crime de lesa-pátria. O exemplo
maior foi trazer dos Estados Unidos documentos destinados a torpedear o
programa nuclear brasileiro.
Peça 3 – a desmoralização final da República
E, agora, como ficará a PGR ante a exposição da Globo a diversas
acusações? Do lado da Espanha e do FBI, o caso CBF-Copa Brasil. Do lado
de Temer, os ataques às jogadas fiscais da Globo. E, de sobra, as
suspeitas de que a Lava Jato estaria impedindo a delação do ex-Ministro
da Fazenda Antônio Palocci, justamente por poder atingir a aliada Globo.
A impunidade da Globo significará a desmoralização final do MPF, da
Justiça e de qualquer veleidade de se ter uma nação civilizada, na qual
nenhum poder é intocável. O enfrentamento da Globo, mesmo por uma
quadrilha como a de Temer, trinca a imagem de intocabilidade da empresa.
Finalmente, quebrou-se o tabu.
Por outro lado, uma eventual vitória de Temer significará a entronização, no poder, de uma organização criminosa.
Finalmente, um acordão significaria um pacto espúrio que não passaria pela garganta da opinião pública.
Não há saída boa.
Todo esse lamaçal foi ocultado, até agora, pelo estratagema de
construção de um inimigo geral, Lula e o PT. Foi a repetição de um golpe
utilizado em vários momentos ultrajantes da história, do incêndio de
Reichstag ao macarthismo, dos processos de Moscou ao golpe de 1964: a
criação de um grande inimigo externo, para justificar todos os abusos do
grupo vencedor.
Agora o álibi se desgastou como um balão furado, com o nível do rio baixando e expondo todos os dejetos.
A sentença de Sérgio Moro condenando Lula não foi endossada publicamente por ninguém.
Na Folha, o corajoso Elio Gaspari precisou colocar uma enorme
ressalva - de que nos Estados Unidos Lula estaria condenado – para
admitir que o Código Penal brasileiro não autoriza a condenação de Lula.
Esqueceu de lembrar que nos EUA as estripulias de Moro e do MPF não
teriam passado da primeira rodada.
Já o advogado Luiz Francisco Carvalho competente penalista, admitiu
que não há nenhuma prova sustentando a sentença de Moro, aceitou que
Lula não é corrupto. Em vez da condenação dos abusos de Moro, preferiu
concentrar-se nas críticas às reações de Lula. Ou então a demonstração
de equilibrismo de Carlos Ari Sundfeld, que não é nem contra, nem a favor, muito pelo contrário.
Todas as deformações trazidas pelo golpe ficarão claras, agora.
As ondas trazidas pela quebra da institucionalidade criaram movimentos incontroláveis.
O grupo do impeachment esfacelou-se em mil pedaços, o grupo de Temer,
o grupo da Globo, um PSDB partido ao meio, um PGR que enfiou o MPF em
uma aventura irresponsável, a Lava Jato esvaindo-se nos seus próprios
exageros.
E agora, José? No inferno, Eduardo Cunha dá boas gargalhadas e prepara seu tridente.
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