“Vai passar
Nessa avenida um samba popular
Cada paralelepípedo
Da velha cidade
Essa noite vai
Se arrepiar”
Chico Buarque, trecho de “Vai passar”
Nessa avenida um samba popular
Cada paralelepípedo
Da velha cidade
Essa noite vai
Se arrepiar”
Chico Buarque, trecho de “Vai passar”
Você vai ler nos jornais hoje que as belíssimas Império Serrano e
Vila Isabel foram o diferencial da Avenida, no primeiro dia de desfiles
do Grupo Especial do Rio. Mas quem saiu mesmo da curva – aliás,
despencou da curva -, como mostra a tremenda repercussão nas redes
sociais, foi a modesta Paraíso do Tuiuti, que passou pela avenida, na
madrugada deste dia 12, com a mais contundente crítica ao governo Temer
jamais vista em horário nobre, transmitida ao vivo pela TV Globo.
Ovacionada na Sapucaí, fez o desfile mais politizado e crítico em muitos
anos de Carnaval, remetendo aos tempos do carnavalesco Joãozinho
Trinta, que em 1989, era Collor, levou para a avenida o enredo “Ratos e
Urubus, Larguem a Minha Fantasia”. Nenhum protesto anti-Temer fez
estrago igual, com tamanha audiência.
Dessa vez, usando como enredo “Meu Deus, meu Deus, está extinta a
escravidão?”, a escola do carnavalesco Jack Vasconcelos trouxe críticas à
reforma trabalhista, bandeira número um do governo, com uma ala de
carteiras de trabalho sujas, vistas como as novas cartas de alforria,
retratando a forma mercantilista das relações de trabalho. A ala
“guerreiros da CLT” representava os trabalhadores que, com múltiplos
braços, estão tentando se proteger dos ataques à legislação trabalhista.
No último carro, para não deixar dúvidas, um “presidente vampiro”,
interpretado pelo professor de história Léo Morais. Chifres, faixa
presidencial purpurinada, gola alta feita de maços de dinheiro, e um
rosto nitidamente familiar. Temer, claro.
Repleto de críticas sociais, o desfile da escola de São Cristóvão
apresentou uma ala em que ironizava os “panelaços”, com passistas
vestidos com camisas das cores do Brasil, dentro de patos e manipulados
por uma mão gigante, como se fossem marionetes. Logo após a
apresentação, vista como histórica nas redes, a escola foi parar no
primeiro lugar dos trending topics do Twitter, com o assunto mais
comentado na rede social no Brasil; e segundo no mundo.
Mas poucas coisas foram tão divertidas quanto a saia justa por que
passaram os comentaristas da Globo, ao vivo, com as imagens do Tuiuti
esfregadas na telinha. Do camarote de vidro, onde narravam o desfile,
Fátima Bernardes, Alex Escobar e Milton Cunha puxaram o freio diante do
surpreendente protesto, como se estivessem constrangidos. “As
desigualdades vem vindo até os dias de hoje”, ensinou Fátima. “O
vampirão!”, quase berrou Milton, diante do óbvio Temer. Alex Escobar
apenas riu. E Fátima observou: “É o regime de exploração nos mais
diversos níveis”. Um pouco depois, Escobar disse o que todos viam: “Tá
com a faixa de presidente, esse vampiro”. E Fátima, lendo o roteiro:
“Vampiro neoliberalista”. Temer! Ninguém falou em Temer! Encerrado o
desfile, como de praxe, o camarote da Globo recebeu vários participantes
do desfile da Tuiuti. O vampirão não foi convidado.
Sobrou também para o prefeito da IURD, Marcelo Crivella, que, mais
uma vez, se recusou a acompanhar, no Camarote da Prefeitura, a festa
mais popular da cidade que administra. Trocou o sambódromo, onde
desfilam representantes das principais favelas do Rio, por um tour por
Alemanha, Áustria e Suécia. Em seu desfile, a Mangueira deu o troco: um
dos carros representou Crivella como um boneco de Judas, acompanhado da
frase: “Prefeito, pecado é não brincar o carnaval”. O enredo “Com
dinheiro ou sem dinheiro eu brinco” tratava do corte de verbas da
Prefeitura do Rio às escolas de samba.
A Acadêmicos da Rocinha, que este ano desfilou pela Série A, levou um
enredo sobre a história da xilogravura para a Marquês de Sapucaí. Mas o
que mais chamou a atenção ficou na comunidade. Uma faixa colocada na
entrada da favela diz, literalmente: “STF – Se prender Lula, o morro vai
descer”. A faixa foi estendida pouco tempo depois de vir à público as
declarações de Jair Bolsonaro sobre metralhar a comunidade. Que tiro foi
esse?!.
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