As elites nas Eleições de 2018
por André Araújo
Muitos comentaristas usam o conceito “ELITES” como um grupo uno,
tratando os personagens desse grupo como se fossem uma coisa só, um
imenso erro de avaliação. Em tempo histórico nunca existiu uma só ELITE
mas sim várias e muitas vezes com papéis conflitivos.
Quais sãos os grupos de elite na ante-sala das eleições de 2018?
ELITE TRADICIONAL – A elite de raiz, o Brasil foi uma Monarquia e
teve uma aristocracia sólida por todo o Império e Primeira Republica.
Descendentes dessa aristocracia tem ainda hoje um denso e subliminar
papel social e intelectual na construção de padrões conservadores, e um
papel econômico e politico pouco visível porque é uma elite extremamente
discreta e pouco percebida. Parte significativa perdeu a fortuna mas
manteve o elitismo da educação e de modos sociais. Uma outra parte
manteve o poder econômico, como as famílias Setubal e Villela que
controlam o Banco Itaú, do grande núcleo dos Aranha de Campinas.
Famílias tradicionais de Pernambuco também mantém poder politico e
econômico, assim como em Minas Gerais, onde famílias descendentes do
Barão de Cocais conservam grande poder econômico (Mares Guia), os
Andrada ainda mantém poder politico assim como outros nomes tradicionais
por todo Estado, antigas engrenagens de presença econômica e politica.
A elite tradicional está especialmente em São Paulo, Rio de Janeiro,
Minas Gerais, Pernambuco e Goiás, onde os Caiado tem presença politica
desde o Império.
A elite tradicional se distingue pela linguagem e postura, muito diferente dos novos ricos.
Eleitoralmente podem ser de esquerda ou direita, nomes dessa elite
foram ícones da esquerda como Caio Prado Junior, Plinio de Arruda
Sampaio. Esquerdistas de origem aristocrática são comuns em todas as
grandes democracias desde o Século XIX, especialmente na Inglaterra.
Franklin Roosevelt era de uma das mais tradicionais e ricas famílias
americanas e foi durante seus quatro mandatos taxado de “comunista”
pelos Republicanos e no mínimo de “esquerdista”, sua prima e esposa,
Eleanor Roosevelt, mais esquerdista do que o marido, era classificada
como “perigosa socialista” pelos conservadores da Costa Leste.
A elite tradicional eleitoralmente optaria por um candidato de
direita esclarecida, como Ronaldo Caiado e sem essa opção possivelmente a
escolha óbvia seria a de Geraldo Alckmin, candidato que tem o perfil do
politico conservador previsível e estável que agrada à elite
tradicional.
ELITE CAIPIRA – Pelo interior do Brasil uma grande classe de
empreendedores agrícolas e industriais enriqueceu e tem grande força
econômica e eleitoral, é uma elite culturalmente tosca e politicamente
pouco sofisticada mas com grandes recursos financeiros. Se embrica numa
elite de novos ricos citadinos ou suburbanos, no conjunto tem o maior
poder financeiro dentro de uma economia em recessão e com escassas
perspectivas de crescimento.
Fazem parte da economia produtiva e são contra a politica econômica deflacionista de hoje.
Eleitoralmente de centro ou centro direita, gostariam de um candidato
a favor do desenvolvimento rápido e gastador em infraestrutura, não
gostam do conservadorismo fiscal excessivo atual, não são moralistas em
politica mas gostam de governo dinâmico.
Politicamente votam por vínculos de amizade ou interesse em políticos
fisiológicos locais. Numa eleição presidencial a tendência é para um
candidato conservador.
ELITE DOS GRANDES ESCRITÓRIOS – Advogados e executivos moderninhos,
com curso no exterior, com carreiras ascendentes, antenados e conectados
com o exterior, integram os grandes escritórios de advocacia,
consultorias de gestão empresarial, de recursos humanos, de marketing,
departamentos jurídicos e de compliance de grandes empresas, agencias de
publicidade e de relações publicas, de relacionamentos “business”,
parte da mídia de negócios, associações empresariais, executivos de
multinacionais anglo-americanas e europeias, professores de escolas
caras e modernas de administração de empresas, a grande comunidade de
profissionais de saúde que tem como clientela a classe mais abonada, o
pessoal do mundo da moda e dos eventos, o espaço fashion.
São grupos bastante coesos, frequentam os mesmos eventos e bares,
tem boa bagagem cultural, antenados no sentido de buscar o mais moderno
em tudo, previsíveis e óbvios, se vestem de forma inconfundível e usam
muitas palavras em inglês, língua franca desse grupo. Um mestrado no
exterior é quase obrigatório para estar no grupo, essa etapa já
distingue economicamente porque significa uma família de origem
abastada.
É um grupo com muito relacionamento social e por essa razão difusor
de ideias e percepções politicas e sociais, também tem fortes ligações
com a mídia, com o judiciário e a classe média em geral, através de suas
famílias, escolas, clubes e redes sociais. É um grupo formador de
opinião e difusor de ideias e portanto de grande peso politico e
mediático.
Elite de aculturação globalizada, não tem e nem querem ter noção de
pátria e sonham em morar no exterior, veem o Brasil com visão negativa,
apoiam campanhas moralistas.
Eleitoralmente de centro direita e anseiam pelo “novo” em politica.
Eleitores típicos de candidatos do perfil João Doria, símbolo do “novo” em politica.
ELITE ROMERO BRITO ou ELITE MIAMI – Empresários novos e ricos, de
origem geralmente classe média baixa, ricos de uma geração, normalmente
tem amizade com algum politico sem distinção de partido, veem politica
como parte do negócio e a analisam de forma como afetam suas empresas
apenas. Não tem interesse naquilo que não lhes afeta diretamente,
culturalmente grosseiros, usam símbolos de riqueza como casas
modernosas, lanchas, aviões, grandes carros importados, relógios e
canetas de grife, não tem um livro ou quadro em casa e se tiver será de
Romero Brito, o ícone dessa elite inculta e rica, sem alinhamento
ideológico.
Fazem parte especialmente do setor de serviços e desconfiam da atual
politica econômica que prejudica a econômica produtiva em benefício do
mercado financeiro.
Eleitoralmente amorfo e não ideológico, podem votar em qualquer
candidato, mas tem simpatia por Jair Bolsonaro pelo fator segurança, uma
preocupação desse grupo, consideram o crime como algo a combater
simplesmente e somente, sem conexão com outros fatores.
ELITE BOLETIM FOCUS – Uma classe à parte, são personagens do
mercado financeiro. Origem social misturada, parte vem da elite
tradicional, parte da classe média, parte de famílias de imigrantes
árabes, judeus ou italianos enriquecidos por empresas que não existem
mais. Totalmente globalizados, para eles o Brasil é apenas uma
plataforma de investimentos, não tem qualquer raiz, respeito ou
admiração pelo País, sonham em morar em Nova York ou Londres bem
abastecidos de dólares ganhos no Brasil na especulação financeira.
Candidato óbvio, Henrique Meirelles, uma espécie de líder ideológico
desse grupo, um enclave estrangeiro no Brasil, vem o Brasil apenas como
um Tesouro emissor de títulos.
ELITE INTELECTUAL– Um grupo de tamanho considerável ligado ao mundo
acadêmico, às universidades, às artes, à literatura, parte da mídia, à
ciência e pesquisa pura. Tem geralmente viés de esquerda, visão
pessimista do Pais e de suas fissuras sociais. Esse grupo ficou órfão
com a queda do Governo do PT e está em busca de novos nomes e projetos.
Esse grupo é contra o total da politica econômica atual e do modelo de
governo em sua integralidade, anseia por grandes reformas politicas e
sociais.
O candidato natural poderia ser Lula, alguém apoiado por Lula, Ciro
Gomes ou qualquer outro desse campo ideológico que possa aparecer,
alguns poderão optar por Marina Silva.
ELITE DAS CORPORAÇÕES – Um força politica nova e extraordinária
devido ao empoderamento nascido da “cruzada moralista” e de sua aliança
politica com a grande mídia. Para esse grupo que inclui a Policia
Federal, a Receita Federal, o MPF, o Poder Judiciário Federal, o
Tribunal de Contas da União, a Advocacia Geral da União e a Defensoria
Publica, seu poder e salários extraordinários, superiores aos
equivalentes americanos e europeus, faz desse grupo uma categoria
especial que sendo parte do Estado, tem do Estado uma visão
exclusivista, se consideram representantes puros do Estado cujos
objetivos julgam interpretar por deterem a supremacia moral, superior à
soberania dos eleitos, que julgam contaminada pela corrupção.
Essa “Nova Inquisição” como movimento gerou uma força inédita na
organização do Estado. Da mesma forma que os Inquisidores lusos tinham
poder politico, que em vários momentos era superior ao do Monarca, com
base na superioridade moral, o poder das Corporações pode desafiar o Rei
e ameaça-lo diretamente, em um processo histórico de raízes profundas
onde aparece a figura do Visitador do Santo Oficio, aquele que vem para
corrigir as impurezas e justiçar os impuros, os contestadores de dogmas,
os bruxos, os pensadores livres, os Ímpios, punir os pecados para o bem
de todos. A figura da punição e da expiação com grande exibição pública
está na essência da Inquisição com seus autos-de-fé e nada tem a ver
com a justiça anglo saxônica, que faz parte de um contrato social e não
da expiação do pecado moral pela destruição do condenado. Há uma
categoria de queima do pecado que não existe nem remotamente no sistema
anglo-americano de justiça, modelo funcional ajustado para fazer a
sociedade operar dentro de regras mecânicas e previsíveis e nada mais
que isso.
No processo inquisitorial o Soberano pode ser o último alvo. Nada
melhor para esse poder transcender ao próprio Estado do que um
Presidente fraco. Por exclusão um Chefe de Estado de perfil autoritário,
dominador e que não aceita poder contrastante que vem de fora seria uma
ameaça, o que elimina de suas preferencias, um perfil tipo Ciro ou
Bolsonaro, pois está claro para Presidentes fortes que será impossível
governar o Brasil com um poder concorrente a ameaça-lo a todo tempo. As
“causas” são irrelevantes, relevante é o Poder, as cruzadas podem ser
anti-corrupção, anti-nepotismo, anti- incompetência, anti-populismo, a
Inquisição variava suas categorias de perseguição, poderia ser a prática
do judaísmo, da heresia, da bruxaria, da blasfêmia, da luxúria. É da
essência da Inquisição a delação do pecador, o delator nasce com a
Inquisição, é sua alavanca processual.
Corrupção sempre haverá sob uma forma ou outra, há corrupção
legalizada, como nos EUA onde grande doares de campanha ganham como
contrapartida uma Embaixada, haverá corrupção maior e mais cristalina do
que essa? Embaixadores americanos em Brasília, como John Danilovitch e
Clifford Sobel não eram diplomatas, mas grandes doadores.
A chapa ideal para o Partido das Corporações seria a de Marina Silva
com Joaquim Barbosa ou vice-versa. Ou outra chapa do mesmo perfil, não
importa a ideologia e sim as personalidades e o que essas representam
como apóstolos do movimento dos “politicamente corretos”.
Chega-se inclusive à ironia do absurdo ou Paradoxo de Arrabal, onde
para a existência do empoderamento é preciso que continue a existir a
corrupção, se esta for eliminada deixa de existir a razão da cruzada,
como os médicos oncologistas dependem da existência do câncer.
A DIVERSIDADE DAS ELITES
Erram os cientistas políticos, ativistas e pensadores que continuam a
tratar as ELITES como um elemento único, com expressões tipo CANDIDATO
DAS ELITES. Em todos os tempos da História as elites nunca foram
uniformes, a regra é o antagonismo de interesses e de crenças.
A clivagem central da Revolução Francesa foram entre três elites, a
da nobreza, a do alto clero e a da burguesia, o povo entrou como
figurante apenas. Elites representam visões de mundo e conjunção de
interesses e tantas haverá quantos forem diversos os paradigmas sociais.
A ELITES são os atores centrais da História e dos processos
políticos, desde o registro na História escrita de 100 séculos, na Roma
antiga, no Império Romano do Oriente, na Idade Média, na formação do
Estado Nacional da Era Moderna, na reconstrução dos escombros da
Revolução Francesa pelo Congresso de Viena de 1814, na Paz dos 100 anos
que chegou à Primeira Grande Guerra., os conflitos da História foram o
conflito das elites.
No Brasil elites em conflito estavam presentes na Proclamação da
Republica, na Revolução de 30, no Estado Novo, na Republica de 1946, no
Regime Militar de 64, na Republica de 1985 e chegamos em nossos dias com
as elites divididas como nunca antes, falta-lhes um eixo condutor, o
esgarçamento das elites representa a ameaça de fragmentação do Pais.
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