Washington têm necessidade dramática de fontes de energia baratas
e vê como inadmissível um país com imensas reservas aliado à China e
Rússia, no contexto dos BRICS
Por José Álvaro de Lima Cardoso
Quem não entender que o petróleo está no centro do processo golpista
em operação no Brasil terá dificuldade de compreender a conjuntura
econômica e política nacional. Os EUA, que dão as coordenadas principais
do golpe no Brasil, têm uma necessidade dramática de fontes de
suprimentos, na medida em que é o maior consumidor de petróleo do mundo,
mas não em quantidade suficiente para suprir o consumo do país. Por
detrás do golpe no Brasil (como ocorreu nos demais países da América
Latina que foram golpeados) há uma constatação de caráter estratégico,
que é definitiva: o petróleo barato de produzir não tem nenhum
substituto. Ele acabou, e o mundo já há algum tempo sofre as
consequências políticas, sociais e militares deste problema. A produção
de petróleo não convencional (o chamado “shale oil”, produção a partir
de xisto betuminoso), vem adiando um pouco o momento em que a produção
mundial de combustíveis irá diminuir em termos absolutos (ver o
importante artigo “Energia e desenvolvimento soberano, em dez lições”, de Felipe Coutinho).
Os recursos do pré-sal, anunciados pela Petrobras
em 2006, mudaram a inserção e a posição do Brasil na oferta de energia
mundial. Eles podem chegar a 300 bilhões de barris, o que significa, em
termos monetários, algo em torno de R$ 30 trilhões. Apesar das
declarações estapafúrdias de alguns “especialistas” à época do anúncio —
que diziam dentre outras coisas que o óleo do pré-sal era inviável
comercialmente — este já representa hoje 50% da produção nacional. A
estimativa do setor é que, se o Brasil não tivesse descoberto o pré-sal,
hoje o país já estaria importando 500 mil barris/dia de petróleo. O
produto extraído do pré-sal possui, além disso, alta produtividade e
baixo risco de exploração, razões pelas quais, também, motivou um
sórdido golpe de estado.
Segundo denúncia da Federação Única dos Petroleiros (FUP), que
organiza neste momento um calendário de luta, o golpe passará a atacar
agora as refinarias, com a venda de 60% de quatro unidades essenciais:
REPAR (PR), Abreu e Lima (PE), RLAM (BA) e Refap (RS). Somente a venda
dessas quatro unidades irá afetar o emprego de 3.700 trabalhadores. Mas o
pacote inclui ainda 24 dutos e 12 terminais. O golpe segue, assim, um
roteiro criminoso, visando converter o Brasil em mero provedor de
matérias-primas para o mundo desenvolvido e, ao mesmo tempo, transformar
o país em importador de derivados do petróleo e de produtos
industrializados em geral.
Um aspecto peculiar deste golpe é que é possível denunciar suas
consequências ao mesmo tempo em que ele vai se desenvolvendo. Porém,
como estamos em processo de guerra semiótica e não temos força para
barrar as ações do golpe neste momento, praticamente nada acontece. É
uma briga de David contra Golias.
O Brasil é vítima da chamada guerra híbrida, guerra não
convencional, que se vale de instrumentos linguísticos e simbólicos,
usando métodos altamente sofisticados. Esse tipo de metodologia utilizou
“aliados internos” para perpetração do golpe, no Judiciário, na
polícia, entre as empresas, na mídia, no parlamento e demais estruturas
do Estado. Foi um golpe parlamentar/jurídico/midiático.
Os EUA estão dando golpes no mundo todo, com atenção especial para a
América Latina, que consideram seu “quintal”. Porém, além do petróleo e
outras matérias-primas essenciais, uma explicação central do
envolvimento dos EUA no golpe no Brasil é também a tentativa de impedir
que se crie outra potência no continente americano. Uma potência na
América do Sul e ligada comercial e politicamente à China e à Rússia é
tudo o que os Estados Unidos não querem. Não foi por acaso que o ataque
inicou pela Petrobras e pelas grandes construtoras, a começar pela
Odebrecht. Essas empresas eram estratégicas para o ataque do capitalismo
financeiro americano no enfraquecimento dos BRICS e no processo de
inserção autônoma, econômica do Brasil junto com Rússia, China, e os
demais países.
Há brasileiros bem intencionados achando que as eleições de 2018 irão
“consertar tudo”. Mas é grande o risco de as eleições serem apenas um
mecanismo de institucionalização do golpe. O serviço não foi concluído,
pretendem aprofundar muito mais a destruição, o que passa por
institucionalizar o golpe, isto é, dar-lhe uma fachada de legalidade. E
as eleições terão um papel fundamental nisso, se conseguirem garantir a
vitória de um candidato seu. Se perceberem que não irão conseguir
emplacar um candidato irão inviabilizar as eleições, utilizando
qualquer pretexto (como no caso do impeachment em 2016). Irão lançar
mão, se precisar, inclusive do golpe militar. É uma temeridade que uma
parte significativa dos trabalhadores esteja apostando todas suas fichas
nas eleições, dentre outras razões porque elas podem não acontecer.
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