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terça-feira, 23 de agosto de 2016

Herói: tem para todos os gostos Ou: "O juiz é um herói?", por Mouzar Benedicto.



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Por Mouzar Benedito.

Vi recentemente uma revista que trazia na capa a foto do juiz Sérgio Moro e o título “Herói do Brasil”. E tem quem defenda sua candidatura a presidente da República. Antes dele, outro magistrado, Joaquim Barbosa, então ministro do STF, também foi chamado de herói e chegou a entrar nas pesquisas de intenção de votos para presidente. E pular da condição de “herói” para a política não é incomum
Estranho? Bom… Independente de entrarem ou não para a política, fico intrigado com o conceito de herói e essa necessidade de dar esse epíteto a alguém, seja por que motivo for, a não ser aquele mais primário que me foi ensinado.
Muitos brasileiros parecem necessitar de heróis e nomeiam alguns deles pelos mais variados motivos.. Sempre achei que mais esquisito é chamar de heróis alguns esportistas glorificados. Ganham milhões para praticar um esporte e ainda são chamados de heróis?
No meu aprendizado dos tempos de criança, herói era um indivíduo, como está definido no Dicionário Houaiss, “notabilizado por seus feitos guerreiros, sua coragem, tenacidade, abnegação, magnanimidade etc.”. Nelson Rodrigues uma vez escreveu: “Os heróis morrem em combate. Não dá tempo ao destino flagrá-los na cama ou na cadeira de balanço”. Corresponde mais ou menos ao que eu pensava “antigamente”.
Mas vi no próprio Dicionário Houaiss, que a palavra herói pode ser empregada também em muitos outros casos. Por exemplo: indivíduo notabilizado por suas realizações (“os heróis da ciência”), indivíduo que desperta enorme admiração; ídolo, indivíduo que em certos acontecimentos é o centro das atenções, e muitas outras. Então vale para tudo quanto é situação que eu achava que rebaixava o peso simbólico do heroísmo.
Tem uma coisa: tudo depende do lado que você está. O bandido de uns é o herói de outros. Basta lembrar dos bandeirantes: nomes de ruas e estradas, eles são “heróis” que desbravaram o Brasil e expandiram suas fronteiras, conquistaram territórios. Mas desbravaram por cobiça, caçavam índios aos milhares para escravizar e matavam os que não lhes serviam.
E os desbravadores do oeste do Estados Unidos? Búfalo Bill, para os índios de lá, não era nada mais do que um dos maiores bandidos que havia. Vale para quase tudo quanto é colonizador.
De qualquer forma lembro o que disse Bertolt Brecht: “Miserável país aquele que não tem heróis. Miserável país aquele que precisa de heróis”.
O Barão de Itararé, que se autointitulou Herói de Dois Séculos, ironizava os “nobres” brasileiros com títulos de conde, barão, visconde… Para ganhar tais títulos, era preciso (teoricamente) ter participado de batalhas, mas aqui eles compravam esses títulos ou ganhavam simplesmente como presentes do imperador. Então, durante a Revolução de 1930, em que chegou-se a noticiar uma grande batalha que na verdade nunca ocorreu, entre paulistas e gaúchos, na cidade de Itararé, no Vale do Ribeira, ele se declarou herói dessa batalha, deu a ele mesmo o título de Duque e depois, como prova de “modéstia” se rebaixou a Barão. Por ter nascido no final do século XIX, acrescentou ao epíteto “herói” o complemento “de dois séculos”.
Ao fazer uma apresentação de uma reedição facsmilar de seu Almanhaque de 1949, em 1991, lembrei dessa história e previ que suas frases gozadoras entrariam também pelo século XXI, brinquei que ele viraria “Herói de três séculos”, o que mantive como título de um livrinho que escrevi sobre ele.
Apesar de escrever bastante sobre política e políticos — “que são datados, perdem a validade de uma geração para outra” — suas máximas sobreviveram e continuam valendo, pois — por exemplo — ainda há muitos políticos que continuam achando que “o feio em eleição é perder”, e que a política é um vale-tudo.
Pensando nisso tudo, catei por aí um monte de frases sobre heróis, e as apresento aqui, começando por uma do próprio Barão: “Há heróis de dois tipos: os que a pátria chora porque morreram e os que a pátria chora porque não morreram”.
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Umberto Eco: “O verdadeiro herói é sempre herói por engano; sonhou ser covarde honesto como os outros”.
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Herbert Spencer: “O culto dos heróis é o mais forte onde a liberdade humana é menos respeitada”.
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Lygia Fagundes Telles: “Não separe com tanta precisão os heróis dos vilões, cada qual de um lado, tudo bonitinho como nas experiências de química. Não há gente completamente boa nem gente completamente má, está tudo misturado e a separação é impossível. O mal está no próprio gênero humano, ninguém presta. Às vezes a gente melhora. Mas passa…”.
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Jean de La Bruyère: “Não construam estátuas aos vossos heróis, é melhor erguer estátuas às suas vítimas”.
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Ivan Teorilang: “Nos bancos de escola, antes de se glorificar nossos heróis do passado por seus feitos em guerra, se deveria dar muito mais ênfase ao aprendizado da diplomacia, pois é a partir daí que as guerras seriam ganhas, sem nenhum derramamento de sangue”.
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Nelson Mandela: “É muito fácil enfraquecer e destruir. Os heróis são os que pacificam e constroem”.
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Renato Russo: “Não preciso de modelos, não preciso de heróis, eu tenho meus amigos”.
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Cazuza: “Meus heróis morreram de overdose, meus inimigos estão no poder”.
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Bette Davis: “Voltemos aos tempos felizes, em que havia heróis”.
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André Malraux: “Não existe herói sem plateia”.
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Sêneca: “Tirai do gênero humano a sua vaidade e a sua ambição, e acabareis de vez com os heróis e os patriotas”.
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Rui Barbosa: “O heroísmo não está na embriaguez impulsiva da cegueira diante dos perigos: está na indiferença diante da morte pela verdade, pela liberdade, pela honra, pelo bem”.
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Menotti Del Picchia: “Não há heroísmos: há consagrações”.
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Eugène Ionesco: “Pensar contra o nosso tempo é um ato de heroísmo. Mas dizê-lo é um ato de loucura”.
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Alberto Caeiro (heterônimo de Fernando Pessoa): “Se ninguém condecora o sol por dar luz, para que condecora quem é herói?”.
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Ditado popular: “A loucura é a origem das façanhas de todos os heróis”.
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Marquês de Maricá: “Se os homens não tivessem alguma coisa de loucos, seriam incapazes de heroísmo”.
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Maricá, de novo: “Mudai os tempos, os lugares, as opiniões e circunstâncias, e os grandes heróis se tornarão pequenos e insignificantes homens”.
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Charles Chaplin: “Quem mata um homem é chamado de assassino. Quem mata milhares é chamado de herói”.
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Chaplin, de novo: “A humanidade não se divide em heróis e tiranos. As suas paixões, boas e más, foram-lhes dadas pela sociedade, não pela natureza”.
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Rubem Alves: “As razões de poder transformam crimes em heroísmo”.
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Provérbio africano: “Até que os leões inventem as suas próprias histórias, os caçadores serão sempre os heróis das narrativas de caça”.
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Laurence Sterne: “A temeridade muda de nome quando obtém êxito. Então chama-se heroísmo”.
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P. Bona: “O primeiro grau do heroísmo é vencer o medo”.
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Paul Claudel: “Os indivíduos só são heróis quando não podem agir de outra maneira”.
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Millôr Fernandes: “Chama-se de herói o cara que não teve tempo de fugir”.
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Leon Eliachar: “Herói é o sujeito que teve a sorte de escapar vivo”.
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Jean Giradoux: “O homem em tempo de guerra chama-se herói. Pode não ser mais corajoso e fugir a toda pressa. Mas, ao menos, é um herói que bate em retirada”.
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Giradoux, de novo: “Os heróis são aqueles que tornam magnífica uma vida que já não podem suportar”.
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Albert Camus: “O heroísmo de pouco vale. A felicidade é mais difícil”.
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Ralph Emerson: “Todo herói torna-se um chato”.
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Giacomo Leopardi: “A paciência é a mais heroica das virtudes, justamente por não ter nenhuma aparência de heroísmo”.
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Charles Bukowski: “A raça humana exagera em tudo: seus heróis, seus inimigos, sua importância”.
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Ditado popular: “A adversidade faz heróis”.
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Victor Hugo: “O infortúnio, o isolamento, o abandono e a pobreza são campos de batalha que têm heróis”.
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Ditado popular: “A mal desesperado, remédio heroico”.
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Luigi Pirandello: “Toda a gente pode ser um herói de vez em quando, mas um cavalheiro é algo que se é sempre ou não se é”.
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Eleanor Roosevelt: “Não temos de nos tornar heróis do dia para a noite. Só um passo de cada vez, tratando cada coisa à medida que surge, vendo que não é tão assustadora como parecia, descobrindo que temos a força para a superar”.
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Gustave Le Bon: “O heroísmo pode salvar um povo em circunstâncias difíceis, mas é apenas a acumulação diária de pequenas virtudes que determina a sua alma”.
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Oscar Wilde: “Antigamente canonizávamos nossos heróis. O método moderno é vulgarizá-los”.
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Nietzsche: “Não desfaças o herói que está em sua alma”.
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Armando Nogueira: “Heróis são reféns da glória. Vivem sufocados pela tirania da alta performance”.
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François La Rochefoucauld: “Há heróis no mal, como no bem”.
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Simón Bolívar: “Do heroico ao ridículo não há mais do que um passo”.
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Gostou? Clique aqui, para ver todas as outras colunas da série “Cultura inútil”, de Mouzar Benedito, no Blog da Boitempo!
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Mouzar Benedito, jornalista, nasceu em Nova Resende (MG) em 1946, o quinto entre dez filhos de um barbeiro. Trabalhou em vários jornais alternativos (Versus, Pasquim, Em Tempo, Movimento, Jornal dos Bairros – MG, Brasil Mulher). Estudou Geografia na USP e Jornalismo na Cásper Líbero, em São Paulo. É autor de muitos livros, dentre os quais, publicados pela Boitempo, Ousar Lutar (2000), em co-autoria com José Roberto Rezende, Pequena enciclopédia sanitária (1996) e Meneghetti – O gato dos telhados (2010, Coleção Pauliceia). Colabora com o Blog da Boitempo quinzenalmente, às terças.

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